sábado, 22 de março de 2025

Oriente Médio segue em convulsão

Vamos lá, vou deixar Irã e Israel por último, ainda que ambos serão citados durante o texto. E vamos começar ali pela entrada do Mar Vermelho, onde os Houthis voltaram a fechar a passagem para navios que tentam ingressar no mar vermelho, seja para os portos da região, seja para acessar o Canal de Suez. Navios chineses, russos, e algumas outras poucas bandeiras estão fora de perigo, desde que não tenham carga para Israel, ou viaje para seus portos. E eles começaram afundando um navio que eles alegam ser de bandeira de Israel. Também já entraram em confronto com o EUA, tendo tido a capital, Sanaã, e algumas outras localidades bombardeadas. Em represália afirmam que derrubaram mais um drone e atacaram a frota americana. O porta-aviões USS Harry Truman teria sido atacado e atingido, e uma fragata de escolta também teria sido atacada. Além disse atacaram com um míssel uma base aérea israelense e ameaçam o aeroporto Ben Gurion, de Tel Aviv, incluindo os voos comerciais. Além de nitidamente os Houthis contarem com uma tecnologia impensável para um grupo do porte que apresentam, eles têm muito apoio do Irã e dizem, da Coréia do Norte, que provavelmente abastecem os Houthis com armas e equipamentos, além de estarem entrincheirados nas montanhas e é muito difícil tirá-los ou achá-los em suas posições, para isso seria necessária uma invasão em grande escala aconteça ao território. Especialistas militares estimam de 400 a 700 mil homens para um assalto desse tipo, o que teria um custo financeiro, social e político gigantesco. Um problema muito difícil de se resolver pela força. Além disso uma ação desse tipo pode trazer enorme risco à economia global, porque os Houthis já mostraram que têm capacidade para atingirem, por exemplo, os campos petrolíferos da Arábia Saudita, e talvez até mesmo causarem enorme destruição desses campos. Isso catapultaria uma gigantesca alta do dólar, levando o mundo a uma profunda recessão.

Um pouco mais acima temos os Palestinos. Atualmente temos parte em diáspora, parte confinada em Gaza, e outra parte na Cisjordânia. O frágil e nunca cumprido cessar-fogo entre eles e Israel foi quebrado de vez. Israel já volta a bombardear civis e instalações de infraestrutura, e o Hamas responde com alguns mísseis e foguetes em direção ao território israelense. As condições do cessar-fogo não foram totalmente cumpridas porque os Hamas acusa Israel de ter quebrado o acordo várias vezes, e de ter se recusado a completar a troca de “prisioneiros” entre eles. Cada vez mais as ações tomam ares de horrores, enquanto o mundo assiste sem tomar uma atitude séria para impedir sua escalada.

Um pouco mais acima temos o Líbano. O Hezbolah esteve em sério confronto com Israel, quando o mesmo cessar-fogo que terminou em Gaza se fez valer também para eles. Os confrontos já tinham deixado de ser à distância, e Israel buscava entrar no território libanês, mas enfrentava ferrenha defesa do Hezbolah e os avanços das forças israelenses foram pífios. Ainda que Israel tenha voltado a bombardear algumas áreas do Líbano, o confronto está longe de assumir o alcance que tinha antes do cessar-fogo.

Na Síria a coisa é bem diferente. O novo governo não consegue manter controle sobre as facções que formaram as forças que depuseram Assad, e temos vários problemas no país. Nas Colinas de Golan Israel completou a conquista e fixou posições, e mesmo que oficialmente o novo governo tenha afirmado que Israel deveria deixar o local, nada faz de efetivo para isso. Na região majoritariamente alauita fervilham vídeos de massacres e assassinatos de civis. As bases russas abriram as portas e têm aceitado refugiados. Também tem feito o transporte de muitos deles para a própria Rússia a fim de minimizar o problema. Mas a verdade é que essa é uma solução precária para milhões de pessoas. Ao norte os curdos estão se acertando com os Turcos, e já ameaçam o território. Como eu disse, próximo à fronteira com o Iraque as forças leais a Assad iniciaram uma contra-insurreição, e já dominam ao menos uma cidade e duas vilas. Nas montanhas os leais a Assad iniciaram um movimento de guerrilha, mas também tímido. Ou seja, o país está completamente dividido, e há grande probabilidade de ser partido em várias partes como resultado de todos esses embates. Mas os BRICS afirmaram que irão voltar suas atenções ao Oriente Médio e agir para resolver esses problemas assim que causas mais urgentes para eles estejam sanadas.

No Irã, ou Irão para os portugueses, as coisas estão um pouco mais controladas, mas não menos tensas. O mesmo sujeito que às vezes parece sofrer de dupla personalidade agora volta às suas. Sim, porque foi Trump quem se retirou do acordo de controle nuclear que havia com os iranianos em seu primeiro governo, e agora é ele quem quer assinar novo acordo. Os iranianos afirmaram que não assinarão nada, e Trump já os ameaçou, dando um prazo de 2 meses para que mudem de posição. A coisa complica porque apesar de Putin ter dito em seu telefonema com que não apoia uma bomba nuclear iraniana, Rússia e China disseram em uníssono apoiarem o programa nuclear dos persas, e garantiram apoio a seu principal aliado na região e membro dos BRICS. Os russos vêm armando o país e se Trump tentar partir para um solução violenta poderá enfrentar enormes dificuldades. Vale lembrar que os iranianos afirmam categoricamente que não estão desenvolvendo a bomba.

Em Israel a situação está ainda mais complicada do que no Irão. Isso porque os persas recebem pressão de fora, mas internamente não apresentam grande cisão. Mas em Israel a situação está complicada de várias partes. De fora vem a pressão de atores que já mencionamos acima, como os Houthis, Hezbolah, Hamas e Irão, ainda que contem com grande apoio do EUA, tanto financeiro, como material e até operacional, já que o Tia San vem mantendo uma frota pelo Mar Vermelho e garantido apoio aéreo a várias operações israelenses. Mas acontece que Israel tem uma enorme fratura interna. Os judeus ortodoxos têm se posicionado contra as guerras de conquista de Israel não é de hoje, mas eles estão mais ativos nesse momento. Para completar já se veem cisões políticas entre as instituições do Estado. O governo de Netanyahu está em guerra com a Suprema Corte do país, e o próprio governo está rachado. Outras instituições civis, como sindicatos e mesmo grandes empresas se colocam contra o governo e ameaçam paralisar o pais caso Netanyahu não reveja a demissão de Ronen Bar, chefe do serviço de segurança interna, que já foi revertida na Suprema Corte. Além disso, a não conclusão da troca de “prisioneiros” agitou a população, que tem protestado fortemente nas ruas. A situação está tão complicada internamente que alguns analistas falam de risco de uma guerra civil, e já vi ativista contra o governo chamando por tal ação. As guerras contra as populações árabes que ocupam as terras que os fundamentalistas que ocupam o governo de Israel dizem ser destinadas ao “Grande Israel” já não são suficientes para manter a coesão do Estado, e as ações do governo, que busca uma reforma Judiciária que levaria a uma concentração excessiva de poder nas mãos do Executivo foram o estopim para unir forças de oposição que estavam dispersas. O problema é que Netanyahu está com um grave problema pessoal, porque se segue com a guerra sua posição tende a se deteriorar mais e ele acabar efetivamente levando a uma cisão total do país, mas se ele recua tende a ser derrubado e as chances de ser processado e preso por abusos praticados são grandes.

Como vemos, e como falei no início, a situação segue muito complicada na região. Ações de força podem levar a resultados catastróficos, sejam econômicos, e com certeza humanitários. Ao mesmo tempo os BRICS precisarão agir para acalmar a região, porque ela é importante nas chamadas “novas rotas da seda” chinesas, e ao mundo multipolar e comercial que é parte fundamental da constituição dos BRICS. Aos próprios estadunidenses não interessa um agravamento que ponha em risco a economia mundial, e não será de todo estranho que ambos os lados se unam para acalmar as coisas por lá. Mas levará algum tempo ainda até que sejam tomadas ações que levem a região a uma paz, se não total, ao menos aceitável.


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