terça-feira, 31 de janeiro de 2017

Liberdades Civis e Liberalismo são coisas distintas

Achei esse texto bastante interessante. Se você for ao site e ver os comentários, irá perceber que alguns tentaram deturpar o que o autor diz, como se ele afirmasse que o Liberalismo é parte do fascismo. Não é, e o autor diz apenas que é muito mais fácil aos defensores do Liberalismo se alinharem a fascistas, e que isso já ocorreu, em algum momento, inclusive nos regimes fascistas clássicos, como os de Mussolini e Hitler.

Porque o que chamam de Liberalismo, nada mais é do que uma ideologia de destruição do Estado como agente de intervenção econômica (salvo para ajudar grandes empresas), ficando esse como simples controlador da população, propiciando lucros elevados, e riscos mínimos aos grandes investidores. Desnecessário dizer que esse processo vem acompanhado de retirada de direitos sociais, econômicos, e das liberdades individuais.

Esse processo é claramente identificável no Brasil, quando vemos partidos defensores do Liberalismo, aliando-se a defensores de praticas fascistas.



Pare de achar que o Liberalismo é oposto ao Fascismo. Eles possuem mais afinidade do que você imagina.

Seria mesmo o Liberalismo
o maior inimigo do Fascismo?

Em tempos nos quais o cinismo impera ao ponto de qualquer procedimento de inversão da realidade ser utilizado para justificar ações convenientes, vem sendo bastante difundida uma máxima cuja acepção crava que “o maior inimigo do fascismo é o liberalismo”. No entanto, é uma pena para os desonestos intelectuais de plantão, que há sempre a possibilidade dos fatos serem trazidos à tona para desmistificarem tais falácias.

O Fascismo teve o Liberalismo como berço


Vilfredo Pareto, economista liberal e um dos ideólogos do movimento fascista.
Comecemos pela história de Vilfredo Pareto, economista liberal e sociólogo italiano de origem francesa. Nascido em Paris, em meados do século XIX, Pareto foi inimigo mortal de todo e qualquer protótipo de socialismo, contrário a qualquer forma de intervencionismo no mercado e defensor da dominação das elites, além de ter sido um dos teóricos que produziram a ideologia precursora do fascismo. É possível que sua convicção na superioridade de uma classe de elite tenha contribuído para a elevação do Fascismo na Itália.
Pareto argumentou que a democracia era uma ilusão (da mesma forma que ultraliberais e neoliberais dizem hoje) e que uma classe dominante sempre irá subsistir enriquecendo-se cada vez mais, ou seja, como todo liberal, acreditava que as desigualdades sociais faziam parte de uma ordem natural. Para ele, a questão-chave era como ativamente agiam os governantes. Por esta razão, ele reivindicou uma redução drástica do Estado e conceituou o regime de Benito Mussolini como uma transição para esse Estado mínimo, de modo a libertar as forças econômicas
“Nos primeiros anos de seu governo, Mussolini literalmente executou a política prescrita por Pareto, destruindo a liberdade política. Mas, ao mesmo tempo, substituindo a gestão estatal pela gestão privada, diminuindo os impostos sobre a propriedade, favorecendo o desenvolvimento industrial e impondo uma educação religiosa nos dogmas.” (BORKENAU, Franz. Pareto . Nova Iorque: John Wiley & Sons, 1936. P. 18.)
É verdade que Pareto considerou o triunfo de Mussolini como uma confirmação de algumas das suas ideias, especialmente pelo fato do líder da Itália Fascista demonstrar a importância da força e compartilhar seu desprezo por um sistema igualitário. Posteriormente, ele aceitou uma nomeação “real” para o senado italiano de Mussolini e morreu menos de um ano após a instauração do novo regime. Contudo, a importância dele para o fascismo foi equivalente a de Karl Marx para o socialismo científico.

O Liberalismo como agenda das políticas econômicas de Mussolini

De 1922 a 1925, o regime de Mussolini seguiu a política econômica do laissez-faire, sob o comando de um ministro de finanças liberal, Alberto De Stefani. O ministro reduziu impostos, regulações, restrições comerciais e permitiu que empresas competissem umas com as outras.
“Depois da nomeação de Mussolini como primeiro-ministro, os industriais sentiram-se ainda mais recompensados com a designação de Alberto De Stefani, um intransigente liberal, como ministro das Finanças – para alegria de Luigi Einaudi ( membro do Partido Liberal Italiano). De Stefani reduziu impostos, aboliu isenções fiscais que beneficiavam contribuintes de baixa renda, facilitou as transações com ações e a evasão fiscal reintroduzindo o animado (abolido por Giolitti), eliminou a regulamentação dos alugueis, privatizou os seguros de vida (introduzidos por Giolitti) e transferiu a gestão do sistema de telefonia para o setor privado.” (SASSOON, Donald. Mussolini e a ascensão do Fascismo. Rio de Janeiro: Agir, 2009. P. 120)
Ademais, a ascensão do Fascismo (tal como a do nazismo de Adolf Hitler na Alemanha) só foi possível com a colaboração e o suporte financeiro de grandes corporações ainda hoje poderosas: BMW, Fiat, IG Farben (Bayer), Volkswagen, Siemens, IBM, Chase Bank, Allianz, entre outros grupos de mídia, que financiaram esses regimes com o objetivo de frear o avanço do socialismo soviético na Europa.
“Os industriais ainda não confiavam em Mussolini, pois sabiam que fora socialista e ainda usava uma retórica socialista. Mussolini deu-se conta disto, tratando, em 1921, de adaptar sua linguagem para o liberalismo econômico e abandonar os princípios de intervencionismo estatal até então apregoados por ele. Em 1922, para todos os efeitos, aderira plenamente ao liberalismo econômico, sendo elogiado por um intransigente liberal em matéria econômica como Luigi Einaudi, que no dia 7 de junho de 1922 acusou o prefeito de Bolonha de bolchevismo por tentar conter a violência fascista.”
(…)
“Antes de 1922, os industriais ignoravam o fascismo ou se mostravam indiferentes. Ao longo de 1922, mantiveram-se basicamente calados sobre o advento do fascismo. Era quase como se tivessem medo de tomar partido ou não conseguissem reunir coragem para apoiar abertamente o fascismo. À medida que os fascistas se fortaleciam, os industriais passaram a simpatizar com eles, como tantos outros que até recentemente defendiam a importância da democracia. No momento em que Mussolini foi designado primeiro-ministro, a maioria dos capitalistas passou a apoia-lo praticamente sem reservas. No dia 29 de outubro de 1922, a Confindustria [p. 119] aprovou de maneira entusiasmada o novo governo (antes mesmo que Mussolini aceitasse formalmente a nomeação).”
(…)
“Isso não quer dizer que os industriais (ou, antes, sua associação, a Confindustria) tivessem se tornado pró-fascistas. Se dependesse de sua preferência, o novo governo seria chefiado por um liberal. Quer dizer apenas que eles também estavam convencidos da generalizada convicção de que não só não deviam ser tomadas iniciativas contra os fascistas, como era necessário entrar em acordo com eles, pois haviam se tornado a principal força anti-socialista do país.”
(SASSOON, Donald. Mussolini e a ascensão do Fascismo. Rio de Janeiro: Agir, 2009. P. 115, 116, 118 e 119)
No dia 20 de setembro de 1922, em discurso pronunciado na cidade de Udine, Mussolini uma vez declarou:

“Queremos retirar do Estado todos os seus poderes econômicos. Basta de ferroviários estatais, carteiros estatais, seguradores estatais. Basta deste Estado mantido à custa dos contribuintes e pondo em risco as exauridas finanças do Estado italiano”.
No filme Fascismo Inc., o cineasta Chatzistefanou esmiúça a também estreita colaboração de industriais e banqueiros com os nazistas para perseguir e destruir o sindicalismo e os socialistas, a quem chamavam de “terroristas”. Detalhe: Hitler extinguiu o Partido Comunista alemão um dia depois de tomar posse.

Teóricos neoliberais justificaram e legitimaram o Nazifascismo


Da esquerda para a direita: Engelbert Dollfuss, Benito Mussolini e Gyula Gömbös. Líderes fascistas tiveram apoio de liberais neoclássicos também, como Ludwig von Mises.
O apoio ao fascismo não se limitava aos liberais do início do século XX. Os liberais neoclássicos que, deram origem à corrente ideológica que se tornou hegemônica hoje, o neoliberalismo, também defendiam o fascismo e sua variante nazista, como projetos políticos necessários para manter a ordem capitalista.
É o que podemos conferir nesta declaração de Friedrich Hayek, membro da Escola Austríaca,  sobre a sua impressão do nazismo:

O economista Friedrich Hayek, Viena, 8/05/1899 – Friburgo em Brisgóvia, 23/03/1992
“É importante recordar que, muito antes de 1933, a Alemanha alcançara um estágio em que não lhe restava senão ser governada de forma ditatorial. Ninguém duvidava então de que a democracia entrara em colapso, ao menos por certo tempo, e de que democratas sinceros como Brüning eram tão incapazes de governar democraticamente como o eram Schleicher ou von Papen. Hitler não precisou destruir a democracia; limitou-se a tirar proveito da sua decadência e no momento crítico conseguiu o apoio de muitos que, embora o detestassem, consideravam-no o único homem bastante forte para pôr as coisas em marcha.”
(HAYEK, Friedrich. O caminho da servidão. 5. ed. Rio de Janeiro: Instituto Liberal, 1990. P. 90)
A complacência de teóricos liberais neoclássicos a respeito do Fascismo prossegue com Ludwig von Mises. Outro ícone da Escola Austríaca, Mises atuou como conselheiro econômico do governo fascista de Engelbert Dollfuss na Áustria. Em seu livro “Liberalismo — Segundo a tradição clássica”, ele reitera que o Fascismo foi um movimento político que teve como um de seus principais objetivos o combate ao bolchevismo.
“As ações dos fascistas e de outros partidos que lhe correspondiam eram reações emocionais, evocadas pela indignação com as ações perpetradas pelos bolcheviques e comunistas. Ao passar o primeiro acesso de ódio, a política por eles adotada toma um curso mais moderado e, provavelmente, será ainda mais moderado com o passar do tempo.
Tal moderação resulta do fato de que os pontos de vista tradicionais do liberalismo continuam a exercer influência inconsciente sobre os fascistas.”
(…)
“Ora, não se pode negar que o único modo pelo qual alguém possa oferecer resistência efetiva contra assaltos violentos seja por meio da violência. Contra as armas dos bolcheviques, devem-se utilizar, em represália, as mesmas armas, e seria um erro mostrar fraqueza ante os assassinos. Jamais um liberal colocou isto em questão.”
(VON MISES, Ludwig. Liberalismo – Segundo a Tradição Clássica / Ludwig von Mises. — São Paulo : Instituto Ludwig von Mises Brasil, 2010. P. 75 e 76)
Nesta obra, Mises também não hesitou em legitimar, elogiar e, até mesmo, enaltecer o Fascismo.
“Não se pode negar que o fascismo e movimentos semelhantes, visando ao estabelecimento de ditaduras, estejam cheios das melhores intenções e que sua intervenção, até o momento, salvou a civilização europeia. O mérito que, por isso, o fascismo obteve para si estará inscrito na história. Porém, embora sua política tenha propiciado salvação momentânea, não é do tipo que possa prometer sucesso continuado. O fascismo constitui um expediente de emergência.”


A origem totalitária do Neoliberalismo


Pinochet (à direita) e Friedman (de terno escuro).
O conluio entre liberais e fascistas no combate ao socialismo não para por aí. Antes do general de extrema-direita Augusto Pinochet liderar o golpe militar chileno que destituiu, violentamente do poder, o presidente socialista Salvador Allende – com aprovação da burguesia e apoio financeiro dos Estados Unidos -, surgiu em alguns setores ligados à política externa dos EUA e da Grã-Bretanha um movimento cuja intenção era encaixar os governos desenvolvimentistas do Terceiro Mundo na lógica binária da Guerra Fria. Para os falcões que enxergavam o mundo apenas de forma bipolar, o nacionalismo seria o primeiro passo rumo ao totalitarismo comunista. Portanto, erradicar o desenvolvimentismo no Cone Sul, que era onde ele havia fincado raízes mais profundamente, tornara-se uma meta. Agências como a Administração para a Cooperação Internacional dos Estados Unidos (mais tarde USAID) estavam engajadas em combater o desenvolvimentismo e o marxismo no plano intelectual, bem como suas influências sobre a economia latino-americana.
No que tange ao Chile, o plano consistia em o Imperialismo Ianque financiar estudantes chilenos para aprender economia na mais reconhecidamente anti-comunista escola do mundo – a Universidade de Chicago – de forma a combater ideologicamente as ideias de economistas “vermelhos” latino-americanos, tais como Raúl Prebisch. Naquela universidade, predominava o pensamento do economista Milton Friedman, um dos expoentes da Escola Monetarista e ferrenho defensor da liberdade irrestrita de mercado e do laissez-faire. Os Chicago Boys se tornaram verdadeiros embaixadores de ideias econômicas que na América Latina ficaram conhecidas como “neoliberalismo”. Muitos deles aderiram ao movimento fascista chileno Pátria e Liberdade. Às vésperas do golpe, elaboraram um programa econômico que nortearia as ações da junta militar. Tal programa, um calhamaço de quinhentas páginas, ficou conhecido como “O Tijolo”. Dos dez autores de “O Tijolo”, oito eram Chicago Boys. O teor desse documento era muito similar ao livro de Friedman “Capitalismo e Liberdade” e propunha, dentre outras coisas, privatizações, desregulamentação e cortes nos gastos sociais, a clássica tríade do livre mercado.
Em princípio, as ideias dos Chicago Boys não encontraram campo fértil no Chile, como atestou a vitória da coalizão Unidade Popular em 1970. Só depois do golpe de Estado foi possível pôr em prática suas ideias. Orlando Letelier certa vez afirmou que “os ‘Garotos de Chicago’, como são conhecidos no Chile, convenceram os generais de que estavam preparados para suprir a brutalidade dos militares com os ativos intelectuais que possuíam”.
De fato, no 11 de setembro de 1973, a caserna deu as mãos à austeridade econômica para dar origem a uma das mais violentas ditaduras da história, que também contou com a assessoria e apoio aberto de Friedrich Hayek, cujo maior exemplo de sua aprovação ao governo de Pinochet pode ser extraído da vergonhosa entrevista que concedeu ao jornal chileno EL Mercúrio em abril de 1981. Depois de apoiar o nefasto regime totalitário, justifica: “Uma sociedade livre requer certas morais que em última instância se reduzem à manutenção das vidas; não à manutenção de todas as vidas, porque poderia ser necessário sacrificar vidas individuais para preservar um número maior de vidas. Portanto, as únicas normas morais são as que levam ao ‘cálculo de vidas’: a propriedade e o contrato”. Naquele momento, em que o Hayek dava tranquilamente sua entrevista, muitas vidas estavam sendo sacrificadas nos porões da ditadura fascista do general Pinochet.
Assim, ao contrário do que muitos pensam, a primeira experiência neoliberal não se deu na Inglaterra de Thatcher ou nos Estados Unidos de Reagan. Nasceu, isso sim, gêmea de um sangrento regime militar. Em 1977, de quebra, Pinochet ainda entregou o Ministério das Finanças ao chicago boy Sérgio de Castro.

Considerações finais


A essa altura do texto já fica fácil compreender por que:
– o primeiro bloco de privatizações aconteceu na primeira nação fascista que o mundo conheceu, a Itália, nos anos 1920s (a publicação inglesa The Economist cunhou o termo “privatização” para denominar a política econômica fascista);
– o segundo bloco de privatizações em massa (que inclusive superou a italiana fascista) ocorreu na segunda, Alemanha nazista, nos anos 1930s; e
– após nascerem em berço fascista durante os anos que antecederam a 2ª Guerra Mundial, as privatizações voltaram a aparecer nos anos 1970s, no governo fascista do ditador chileno Augusto Pinochet.
Entretanto, não pretendemos aqui colocar um sinal de igualdade entre Liberalismo e Fascismo. Porém, de fato, o liberalismo não se constituiu em um entrave ao fascismo nascente. Pelo contrário, ele, inclusive, forneceu as justificativas ideológicas para sua expansão europeia – e mais tarde a sul-americana.
A História comprova-nos que Fascismo e Liberalismo podem atuar em consonância. Ora, se eles não são iguais, tampouco existe entre eles uma muralha intransponível. Isso se explica, fundamentalmente, nas alianças feitas entre essas ideologias sempre quando lhes foi conveniente, sobretudo – como é, inclusive, admitido por teóricos liberais – no propósito do combate a seus maiores inimigos comuns: os sociais-democratas, socialistas, comunistas, bolcheviques, marxistas… Isto é, todos aqueles que tinham uma visão crítica do capitalismo, seja propondo sua superação por meios revolucionários ou mesmo propondo políticas reformistas.
Fontes:
• UFCG – Bio de Vilfredo Pareto
• Wikipédia – Vilfredo Pareto
• UFSC – AUTORITARISMO E CHOQUE
• Jacobin – Capitalism and Nazism
• USP – A formulação do pensamento neoliberal na América Latina em perspectiva comparada: o pensamento econômico de Eugênio Gudin (Brasil), Martinez de Hoz (Argentina) e Sergio de Castro (Chile) (PDF)
• Cambridge Journal of Economics – The first privatisation: selling SOEs and privatising public monopolies in Fascist Italy (1922–1925)
 Livro: Pareto e il fascismo (Autor: Giovanni Barbieri)

sábado, 28 de janeiro de 2017

terça-feira, 24 de janeiro de 2017

Não é só para acabar com a Lava-jato

Achei bem interessante o texto divulgado pelo Clube de Engenharia. Para quem acha que essa famigerada caça às bruxas está fazendo algo de bom pelo país, basta dar uma olhada aí embaixo, e entenderá que os prejuízos são muito superiores às benesses. A doença incomodava mas não matava, o tratamento não acabará com a doença, e ainda matará o doente.


Nota de falecimento: a engenharia brasileira está morta



A estratégia geopolítica de nações poderosas que querem nos enterrar não se resume a fortalecer sua própria engenharia e suas maiores empresas. Inclui sabotar as empresas e a engenharia de outros países

Cortes em programa de submarinos, desenvolvido pela Odebrecht para a Marinha causam atrasos, desemprego e prejuízo
Cortes em programa de submarinos, desenvolvido pela Odebrecht para a Marinha causam atrasos, desemprego e prejuízo

A Engenharia Brasileira está morta. Será cremada no altar da Jurisprudência da Destruição, do entreguismo e da ortodoxia econômica. Suas cinzas serão sepultadas em hora e local a serem anunciados no decorrer deste ano de 2017.

Em qualquer país minimamente avançado, a engenharia é protegida e reverenciada como o outro nome do poder, da prosperidade e do desenvolvimento. Não há países que tenham chegado a algum lugar sem apoiar soberana e decisivamente sua engenharia.

Assim como não existem nações que tenham crescido econômica e geopoliticamente sabotando, inviabilizando, destruindo, execrando, ensinando seu povo a desprezar, odiar e demonizar essa área, seus técnicos, trabalhadores, suas empresas, projetos, líderes e empresários, como o Brasil está fazendo agora.
Sem engenharia, os soviéticos não teriam derrotado a Alemanha nazista, com suas armadilhas para Panzers e seus portentosos tanques T-34. Nem enviado o primeiro satélite artificial, o Sputnik, para a órbita terrestre, nem feito de Yuri Gagarin o primeiro homem a viajar pelo espaço.

Sem engenharia, os Estados Unidos não teriam construído suas pontes e arranha-céus, monumentos inseparáveis da mística do american way of life no século 20. Nem produzido a primeira bomba atômica, ou chegado à lua em menos de 10 anos, a partir do desafio estabelecido pelo presidente John Kennedy em 1961.

Desde a consolidação do Império Britânico, ela mesma filha direta, dileta, da Revolução Industrial inglesa; desde a substituição de importações pelos Estados Unidos após a independência, e pela URSS, depois da Revolução de Outubro de 1917, o mundo sabe: não existem nações dignas desse nome que consigam responder a questões como para onde avançar, como avançar, quando avançar, sem a ajuda da engenharia.

Como fez Juscelino Kubitschek, por exemplo, com o binômio “Energia e Transporte” e seus “50 anos em 5”, e os governos militares que – embora o tivessem combatido e perseguido em várias ocasiões – o seguiram na adoção do planejamento como instrumento de administração pública e no apoio a grandes empresas brasileiras para a implementação de grandes projetos nacionais.

Empresas e grupos que estão sendo destruídos, agora, pelo ódio, a pressão e a calúnia, como se tivessem sido atingidos por uma devastadora bomba de nêutrons.

Com a maior parte de seus executivos presos em algum momento, as maiores empreiteiras do país foram levadas a avalizar a transformação de doações legais de campanha e de caixa dois em propina – retroativamente, nos últimos três anos.

A aceitar, na ausência de provas cabais de pagamentos de corrupção na escala bilionária apresentada pela imprensa e aventada pelo Ministério Público a todo momento, a imposição de multas punitivas “civis” a título de nebulosas “indenizações por danos morais coletivos” da ordem estratosférica de bilhões de dólares.

A render-se a discutíveis acordos de delação premiada impostos por uma operação que já acarretou para o país – com a desculpa do combate à corrupção – R$ 140 bilhões em prejuízo, a demissão milhares de trabalhadores, a interrupção de dezenas de projetos na área de energia, indústria naval, infraestrutura e defesa, a quebra de milhares de acionistas, investidores e fornecedores.

Diante de tudo isso, não podemos fazer mais do que comunicar o falecimento da engenharia brasileira, famosa por ter erguido obras pelo mundo inteiro, de rodovias no deserto mauritaniano a ferrovias e sistemas de irrigação no Iraque; passando pela perfuração de galerias e túneis sob as montanhas dos Andes; pelo desenvolvimento de sistemas de resfriamento contínuo de concreto para a construção de Itaipu; ou pela edificação de enormes hidrelétricas na África Subsaariana.

A engenharia nacional está perecendo. Foi ferida de morte por um sistema judiciário que pretende condenar, a priori, qualquer contato entre empresas privadas e o setor público, e desenvolveu uma Jurisprudência da Destruição de caráter descaradamente político, que não concebe punir corruptos sem destruir grandes empresas, desempregar milhares de pais de família, interromper e destroçar dezenas de projetos estratégicos.

Um sistema judiciário que acredita que deve punir, implacável e estupidamente, não apenas as pessoas físicas, mas também as jurídicas, não interessando se esses grupos possuem tecnologia e conhecimento estratégicos, desenvolvidos ao longo de anos de experiência e aprendizado, se estão envolvidos em projetos vitais para o desenvolvimento e a segurança nacional, se deles dependem, para sobreviver, milhões de brasileiros.

A engenharia brasileira faleceu, com seus escritórios de detalhamento de projetos, suas fábricas de bens de capital, seus estaleiros de montagem de navios e plataformas de petróleo fechados, suas linhas de crédito encarecidas ou cortadas, seus ativos vendidos na bacia das almas e seus canteiros de obras abandonados.

E o seu sepultamento está marcado para algum momento de 2017.

Será sacrificada no altar da estúpida manipulação midiática de factoides econômicos, com atitudes desastrosas como a antecipação suicida pelo BNDES – em plena recessão – do pagamento de R$ 100 bilhões ao Tesouro. Um dinheiro que poderia ser imediatamente aplicado em infraestrutura, vai em troca de uma insignificante, irrelevante, pouco mais que simbólica redução de 1% na dívida pública, quando, sem fazer alarde, os dois últimos governos reduziram a Dívida Nacional Bruta de 80% em 2002 para 67% em 2015, e a Dívida Líquida de 60% para 35% no mesmo período, pagando US$ 40 bilhões devidos ao FMI, e economizando mais de US$ 370 bilhões em reservas internacionais nos anos seguintes.

A engenharia brasileira será sepultada, ou cremada, porque não pode mais sobreviver, a longo prazo, em um país que aceitou aumentar os gastos públicos apenas pelo índice de inflação do ano anterior, durante os próximos 20 anos, engessando estrategicamente o seu desenvolvimento, com uma imbecil e limitante camisa de força, enquanto outros países e regiões, como os Estados Unidos e a Europa, muito mais endividados – e desenvolvidos – do que nós, continuarão a se endividar, a se desenvolver e a se armar cada vez mais, já que seu discurso neoliberal e ortodoxo só serve para enganar e controlar trouxas de terceira categoria como os nossos, e quase nunca é aplicado no caso deles mesmos.

Esse hipócrita discurso para trouxas não é apenas econômico, mas também jurídico. E nesse caso, gera ganhos reais, que vão além da eliminação ou diminuição da concorrência de potenciais competidores em campos como o da engenharia.

Da estratégia geopolítica das nações mais poderosas do mundo, não faz parte apenas fortalecer permanentemente a sua própria engenharia e suas maiores empresas, mas, também, sabotar as empresas e a engenharia de outros países, usando desculpas de diferentes matizes, que são repetidas e multiplicadas pela mídia sabuja e babosa desses mesmos lugares.

Não é outra coisa o que os Estados Unidos fazem por meio de órgãos como o Departamento de Justiça e de iniciativas como o próprio Foreign Corrupt Practices Act, sob o manto do combate à corrupção e da proteção da concorrência. Leniente com suas próprias companhias, que não pagam mais do que algumas dezenas de milhões de dólares em multa, os Estados Unidos costumam ser muito mais duros com as empresas estrangeiras.

Tanto é que da lista de maiores punições de empresas pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos por corrupção em terceiros países – incluídos alguns como Rússia, que os Estados Unidos não querem que avancem com apoio de grupos europeus como a Siemens – não consta nenhuma grande empresa norte-americana de caráter estratégico.


A Lockheed Martin e a Halliburton, por exemplo, pagaram apenas uma fração do que está sendo imposto como punição, agora, à Odebrecht brasileira, responsável pela construção do nosso submarino atômico e do míssil ar-ar da Aeronáutica, entre outros projetos, que deverá desembolsar, junto com a sua subsidiária Braskem, uma multa de mais de R$ 7 bilhões, a mais alta já estabelecida pelo órgão regulador norte-americano contra uma empresa norte-americana ou estrangeira.

sábado, 21 de janeiro de 2017

Celtic Woman - You Raise Me Up

O grupo Celtic Woman é originário da Irlanda e já vendeu mais de 9 milhões de cópias. Aqui trazem uma brilhante interpretação de You Raise Me Up, canção de enorme sucesso em alguns países de língua inglesa, e que já foi gravada por mais de cem artistas.



quinta-feira, 19 de janeiro de 2017

Tudo que vimos dizendo e mais


Talvez você ache que o blogueiro exagera, mas temos muita gente boa, que sempre esteve engajada com o progresso do país, que diz as mesmas coisas que esse blogueiro aqui. As medidas econômicas tomadas são recessivas, não irão ajudar o país a sair da crise, não garantirá nada além de pagamento de juros exorbitantes a banqueiros e gente com muito dinheiro, etc, etc.

Até mesmo a fantasia de que tirando Dilma tudo se resolvia está claro que acabou. Empresários que equivocadamente apoiaram o golpe, agora já enxergam que foram logrados, que as medidas não são para promover ou salvar a economia, mas apenas uma pequena parte ligada ao sistema financeiro.

A posição de destaque que o país poderia (e ainda pode) ter no mundo não é importante.

Como não é importante a grande maioria dos brasileiros, que não são tratados como cidadãos, mas tão somente como peças descartáveis em um jogo do qual só participam como moeda de troca.

Peça 1 – as ideias e a conspiração

Nessa geleia geral em que se transformou o golpe, uma boa análise estratégica exige a tipificação mais detalhada do papel de cada personagem.
O poder de fato está em uma entidade chamada mercado.
É o mercado quem forneceu o fio agregador do golpe, o objetivo final, o componente ideológico capaz de criar uma agenda econômica alternativa, em torno dos quais se agruparam a mídia, o PSDB e se induziu à politização de instituições, como o STF (Supremo Tribunal Federal) e o MPF (Ministério Público Federal), montando o círculo inicial que passou a dar as cartas no governo Temer e, possivelmente, no pós-Temer.
É a parte mais eficiente do golpe, seguindo um roteiro fartamente descrito em obras como “A Teoria do Choque” de Naomi Klein. Confira, a propósito, o “Xadrez da Teoria do Choque e do Capitalismo de Desastre” ( https://goo.gl/vZYVzy).
Dado o golpe, reza a teoria (importada da Escola de Chicago), se tem seis meses para emplacar as medidas mais drástica e consolidar o novo modelo.
A nova equipe econômica avançou como um bólido sobre os instrumentos econômicos do Estado, com um plano de ação completo, meticulosamente preparado desde que o PMDB apresentou a tal Ponte Para o Futuro.
Não se trata de um plano de estabilização, capaz de reverter a crise, mas de um desmonte do Estado que aprofundará a crise. É a estratégia da terra arrasada, visando sepultar qualquer vestígio do antigo modelo, independentemente dos custos para o país e seu povo.
·      Apresentou a PEC 55 que, aprovada, acaba com qualquer possibilidade de política fiscal anticíclica e manieta todos os futuros governos.
·      Se vale da crise fiscal para garrotear os governos estaduais.
·      Esvaziou o BNDES, fazendo-o pagar antecipadamente R$ 100 bilhões ao Tesouro.
·      Ampliou a degola das empreiteiras nacionais, proibindo financiamento à exportação de serviços e às empresas mencionadas na Lava Jato.
·      Prepara-se para vender a carteira de ações do BNDES na bacia das almas.
·      Montou uma queima de ativos da Petrobras, em um momento em que todos os ativos nacionais estão depreciados pela crise e os ativos petrolíferos depreciados pelas cotações de petróleo. Vende para reduzir passivo. Deixa de lado todos os investimentos na prospecção, nas refinarias e nos estaleiros (que garantiriam a expansão imediata e a longo prazo) para quitar antecipadamente (!) financiamentos contratados junto ao BNDES. Nenhuma empresa com crise de liquidez quita antecipadamente financiamentos. No máximo, reestrutura passivos.
·      Começou a esvaziar o FGTS, facilitando o saque das contas.
·      Com a ajuda da Lava Jato, jogou a pá de cal na cadeia produtiva do petróleo e gás, no sonho dos estaleiros nacionais, na expansão do capitalismo brasileiro para África e América Latina. Busca a destruição da maior empresa privada brasileira, a Odebrecht, a empreiteira que mais incomodava os concorrentes norte-americanos.
·      Na diplomacia, acabou de matar o protagonismo do Itamarati.
Para atingir seus objetivos, o sistema tem permitido a proliferação das maiores jogadas que o Congresso e o Executivo já ousaram em sua história recente:
·      A iniciativa de entregar às teles os ativos acumulados durante o período de concessão. Aliás, o senador Jorge Viana (PT-Acre) deve explicações a seus eleitores e admiradores.
·      A jogada de transformar multas das teles em obrigação de investimento, reeditando estratagema utilizado pelo inacreditável Paulo Bernardo, quando Ministro das Comunicações. Na prática, equivale a perdoar as dívidas, já que os investimentos teriam que ser feitos de qualquer maneira, por obrigação contratual ou exigência de mercado.
·      A compra gigantesca de produtos Microsoft, interrompendo o trabalho de disseminação do software livre.
·      As jogadas escandalosas do senador Romário, de depositar nas mãos das APAEs e das Sociedades Pestalozzi o controle de toda a educação inclusiva.
·      A tentativa de emplacar os cassinos e casas de bingo.
·      A enxurrada de dinheiro público despejado nos veículos de mídia, cujo melhor exemplo é a campanha milionária de prevenção da Zika e falta de remédios para as grávidas.
·       A MP 754 que faculta à CMED (Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos) autorizar reajustes a qualquer momento. A lei que criou a CMED, em 2003, autorizava-a a determinar apenas reajustes anuais de preços. Agora, haverá reajustes, a qualquer momento, dependendo de uma plêiade de Varões de Plutarco: Ricardo Barros, Ministro da Saúde, Alexandre Moraes, da Justiça, Henrique Meirelles, da Fazenda, o pastor Marcos Pereira, do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, e Eliseu Padilha, da Casa Civil, todos homens piedosos.
·       A tentativa de jogar a Fiocruz sob o comando de Ricardo Barros e Temer.         

Peça 2 – a economia de um país retardatário

Toda essa conspiração política repousa em um edifício teórico que está sob forte processo de questionamento em países culturalmente mais avançados. No Brasil, os temas se tornaram matéria de fé.
Os ideólogos desse manual – tão velho quanto a Escola de Chicago – são os economistas Marcos Lisboa e Samuel Pessôa, ambos competentes em suas funções.
Lisboa é um brilhante economista que, na gestão Antônio Palocci, foi responsável por vários avanços microeconômicos relevantes. Foi alçado à condição de guru pelo megainvestidor Jorge Paulo Lehman. Ao perceber que as eleições de 2002 marcariam o fim do período tucano, Lehman enganchou Lisboa na campanha de Ciro Gomes, por indicação de Alexandre Scheinkman, o brasileiro que dirigia o prestigioso Departamento de Economia da Universidade de Chicago. Depois, coube a mídia o trabalho de, em pouco tempo, torna-lo conhecido e com fama de gênio – seguindo o roteiro conhecido de criação de gurus, mesmo sem uma produção acadêmica robusta.
Eleito Lula, o primeiro aceno de seu Ministro da Fazenda Antônio Palocci ao mercado foi a nomeação de Lisboa como Secretário Executivo da Fazenda. Quando canalizou seu talento para as questões microeconômicas, conseguiu feitos notáveis, como o de destravar o Sistema Financeiro da Habitação.
Agora, seu papel é o desmontar o Estado nacional e implementar um modelo de mercado, não um plano de estabilização, menos ainda um projeto de desenvolvimento equilibrado, que junte as virtudes de mercado com a de Estado. O objetivo único é ideológico, impor terra arrasada em todos os instrumentos de intervenção do Estado na economia – mesmo aqueles consagrados em todos os países civilizados, e peças centrais na recuperação da economia, como bancos de desenvolvimento, ou de comércio exterior, compras públicas, financiamentos à inovação etc. – ainda que à custa de um aprofundamento maior da crise.
Dilma não soube transformar o Estado em um articulador do mercado. Lisboa simplesmente quer abolir o Estado, como se fosse possível a um país da dimensão do Brasil depender do mercado como agente originário das expectativas, algo que nem os Estados Unidos ousam. E tudo isso jogando com o destino de milhões de trabalhadores, de empresários, jogando fora anos de investimento em novos processos, novas tecnologias.
É chocante como a chamada pós-verdade se infiltra até nos círculos tidos como bem informados, com afirmações sobre o ajuste fiscal na União Europeia, quando o próprio FMI está revendo os problemas dos ajustes recessivos.

Peça 3 – a política econômica de manual

Durante o longo período de neoliberalismo – que se inicia em 1972, com a desvinculação das cotações do ouro e do dólar – criou-se a fantasia de que a economia global se articularia passando ao largo das políticas nacionais. Aboliu-se a história econômica como vetor de análises. E, com o advento dos microcomputadores e das planilhas, entrou-se na era do uso abusivo de estatísticas e fórmulas ilusórias em cima de macro-números que encobrem as realidades nacionais e de blocos, e que só trabalham um conceito de equilíbrio utópico, sem nenhum diagnóstico para os grandes stress econômicos.
Especialmente nas ciências humanas –a medicina, as ciências sociais ou a economia – as teorias são instrumentos para se analisar a realidade local e suas circunstâncias. Não existem regras universais. O exame de laboratório não substitui a análise do paciente pelo médico, assim como a teoria econômica não é um manual de aplicação universal. Para cada circunstância, há um conjunto de medidas específicas.
A crise de 2008 abriu os olhos do primeiro time de economistas dos países centrais. Percebeu-se que a economia é muito mais complexa do que as realidades captadas em modelos matemáticos que compensavam a escassa sofisticação analítica com excesso de estatística.
Vale a pena ler a entrevista de Eric Beinhocker na Carta Capital (https://goo.gl/DirQsb). Para cada circunstância, há que se apelar para os instrumentos de política econômica adequados, sem part-pris ideológico. E recorrer também ao conhecimento empírico, especialmente nos casos de stress agudo da economia que criam situações não identificadas na história econômica recente. De tal modo, que o exercício da política econômica é um misto de técnica e arte, de teoria e intuição.
Nos 8 anos de Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, todas as crises econômicas, quase todas nas contas externas, eram tratadas do mesmo modo, com ajustes fiscais severíssimos, que apenas agravavam a recessão. A política de juros e de câmbio produziu um dos períodos de maior estagnação econômica da história.
Em 2008, Lula decidiu enfrentar a mega-crise que se avizinhava recorrendo a todos os instrumentos possíveis para reanimar a economia. Saiu consagrado. E também deu sorte. Se a crise não catapultasse o dólar para as alturas, provavelmente o país teria quebrado em 2008, tal o rombo nas contas externas promovido por uma política cambial imprudente que, além disso, prorrogaria estagnação do período FHC.
A crise do governo Dilma foi decorrência da incapacidade de montar cenários e estratégias alternativas para o fim do ciclo das commodities. Deveu-se também à elevação imprevista de juros em 2013, à sucessão infindável de subsídios que fragilizaram a parte fiscal e, depois, um ajuste fiscal severíssimo, pró-cíclico, que aprofundou a crise: medidas tomadas nos momentos errados.
Em fins de 2015, quando aparentemente conseguira chegar a um diagnóstico mais razoável, com uma estratégia racional de saída da crise, e os analistas previam a recuperação a partir do segundo semestre, foi fuzilada pela ação conjunta da Lava Jato e do Procurador Geral da República, associados ao boicote do PSDB e de Eduardo Cunha na Câmara e no Senado.
As lições que ficam é que as medidas econômicas não são virtuosas em si: dependem das circunstâncias em que são implementadas. Há um conjunto de princípios de responsabilidade fiscal a serem seguidos por qualquer governo. Mas, em períodos de recessão, a política fiscal precisa ser anticíclica – através do aumento dos gastos públicos -, caso contrário a cada corte de despesas se seguirá uma queda maior da receita. Em tempos de economia aquecida, pratica-se política fiscal mais severa. Nenhum economista com um mínimo de bom senso deixaria de considerar essas questões. 
Esse quadro era nítido no início de 2015, quando Joaquim Levy deu inicio a seu plano suicida. Uma dose de conhecimento empírico seria suficiente para mostrar que os cortes fiscais aprofundariam ainda mais a recessão, ampliando o déficit fiscal via queda de receita.
Levy preferiu acreditar em estudos dos anos 90, que supostamente atestariam que cortes de despesas têm pouco impacto no PIB. Nem se deu conta que, em 2012, o próprio FMI tinha revisto essas conclusões.
Para os cabeças de planilha, conhecimento empírico não é ciência e as experiências históricas não tem validade. Valem apenas as estatísticas baseadas em séries históricas contemporâneas.
A cada situação nova, criam desastres monumentais pela incapacidade de só recorrer a manuais montados em cima de situações passadas. Os desastres só serão inteiramente compreendidos quando estudados a posteriori. E, como aqui é o país do Macunaíma, nem mesmo grandes erros recentes – como o pacote Levy – servem de lição para o pacote Lisboa.

Peça 4 – próximas etapas

A fantasia do pote de ouro no fim do arco-íris acabou. A história de que bastaria tirar Dilma para a economia se recuperar já está sendo percebida como blefe pelo cidadão comum.
Tem-se um presidente tão desmoralizado que, a maneira que a revista Veja encontrou para retribuir o megapacote publicitário, foi uma capa-fantasia com a senhora Temer, tal a falta de atratividade em qualquer outro aspecto do primeiro marido.
A economia não irá se recuperar com esse viés ideológico predominando na política econômica. Pelo contrário, há no horizonte próximo o pior dos mundos: o default dos Estados.
Em março o STF (Supremo Tribunal Federal) deverá liberar os inquéritos contra políticos. A quantidade de jogadas planejadas pela camarilha de Temer e pelo Congresso aumentará ainda mais a fragilidade do governo.
A oposição vê nas eleições diretas a saída para a crise. Ocorre que Sérgio Moro, os procuradores da Lava Jato e o TRF4 têm lado político. Ao menor sinal de renascimento de Lula, tratarão de impugnar sua candidatura através da condenação relâmpago em 1a e 2a instância.
Por outro lado, o presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) Gilmar Mendes, deixa transparecer seu cansaço com o Supremo e a possibilidade de aceitar algum cargo executivo futuramente.
No momento, a aposta com maior probabilidade é a degola de Michel Temer seguido de eleições indiretas sob controle do mercado-PSDB, com o PGR cumprindo o papel de agente intimidador de políticos recalcitrantes.
Há muita confusão e poucos personagens, para permitir a montagem de cenários mais precisos.apel de cada personagem.Em março o STF (Supremo Tribunal Federal) deverá liberar os inquéritos contra políticos. A quantidade de jogadas planejadas pela camarilha de Temer e pelo Congresso aumentará ainda mais a fragilidade do governo.

terça-feira, 17 de janeiro de 2017

O mundo em sinuca de bico?

Ótima entrevista com o economista e especialista em análise do sistema financeiro global, Michael Hudson, mostra que precisamos agir o quanto antes para acabar com a hegemonia financeira na economia, como forma de salvar os dois.

Mas ao mesmo tempo novas tecnologias vêm eliminando postos de trabalho de forma cada vez mais rápida e abrangente. A questão é: conseguiremos uma alternativa?

Elas existem, e começam por desarmar a bomba imposta pelo financismo mundial. O investimento maciço em educação é imperativo, e novas formas de as pessoas gerarem renda devem aparecer, como a Economia Solidária, já citada aqui no Blog dos Mercantes.

E para quem acha que é alarmismo infundado, esse não é o primeiro relatório do FMI que aponta para este problema, e Hudson também não é o único que alerta para isso. No Brasil, destacadamente Ciro Gomes e Roberto Requião vêm sistematicamente alertando para esses perigos, e apontando soluções.




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FMI admite não ver saída para a crise global. Michael Hudson explica: peso dos juros paralisa economias, exaure sociedades e amplia riscos de retrocessos. Saberemos enfrentar a aristocracia financeira?
Michael Hudson, entrevistado por Kim Brown, em The Real News Network | Tradução: Cauê Seignemartin Ameni
Como era de esperar, os jornais e TVs da velha mídia nada noticiaram. Em sintonia com o governo Temer, estavam ocupados em demonizar o tímido gasto social do Estado brasileiro. Mas em 5 de outubro, um novo relatório do FMI sobre a estabilidade financeira global lançou o alerta. Apesar de irrigado, desde 2008, por seguidas operações de “salvamento”, sempre com dinheiro público, o sistema financeiro internacional não se recuperou. Embora a grande tempestade tenha passado, “os riscos de médio prazo continuam a crescer”. E — mais intrigante — mesmo no caso de uma recuperação sustentada das economias (algo que não parece próximo), os problemas não estarão sanados.
Dias depois de lançado o relatório, o economista norte-americano Michael Hudson analisou-o, em entrevista à rede de webTV independente “The Real News“. Dedicado há décadas ao exame do sistema financeiro, colaborador de dezenas de publicações e consultor de governos como os da Grécia, Islândia e China, Hudson tem uma visão particular sobre o papel das dívidas, nas sociedades capitalistas contemporâneas. Segundo ele, o pagamento de juros tornou-se, na época pós-industrial, um fator crucial de extração de mais-valia e, portanto, de ampliação das desigualdades.
Hudson vê no relatório do FMI o reconhecimento de um ponto de impasse. O endividamento dos Estados e das famílias tornou-se tão vasto e opressor que passou a comprometer a própria dinâmica de reprodução do capital. Tanto os salários quanto a receita de impostos são permanentemente corroídos pelas transferências aos banqueiros e à aristocracia financeira. Em consequência, a capacidade de compra despenca. Os investimentos estancam. A criação de empregos e ocupações retrocede. Forma-se uma espiral descendente, que bloqueia as economias.
Pior: para sair do impasse, a aristocracia financeira procura, permanentemente, avançar sobre as conquistas cidadãs. Calcula que os Estados devem reduzirem o gasto social — para tornarem-se capazes de pagar mais juros… Aí está a origem das políticas de “austeridade”, da devastação do Estado de Bem-estar social na Europa e, no Brasil, de propostas como a PEC-241, que estabelece o congelamento das despesas não-financeiras do Estado.
Como escapar desta maré anticivilizatória? Em tempos anormais, é preciso propor o incomum. Hudson vê uma alternativa — pouco debatida, mesmo entre a esquerda. Ele defende políticas que promovam uma redução radical das dívidas e dos pagamentos à aristocracia financeira. O relatório do FMI jamais proporá algo com este sentido, zomba o economista. Mas ele mesmo provoca: enquanto não houver coragem e força política para tal passo, permaneceremos sujeitos à estagnação, a crises e à ameaça de retrocessos. Fique com a entrevista(Antonio Martins)
TEXTO-MEIO
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O relatório sobre estabilidade financeira do FMI diz que, apesar de os bancos serem mais fortes agora do que na crise econômica de 2007-2008, cerca de 25% do bancos norte-americanos e 30% dos europeus estão muito fracos até mesmo para se beneficarem de possível aumento nas taxas de juros — ou de qualquer auxílio para recuperação, caso a economia global sofra um novo abalo. Mas antes de entrar em qualquer tema mais específico sobre a saúde dos bancos, pergunto: nestas duas regiões, ainda estamos em recessão ou começamos a nos recuperar?
Não estamos nem numa recuperação, nem numa recessão tradicional. As pessoas pensam nos ciclos econômicos, nos quais há um boom seguido por uma recessão, para que depois os estabilizadores automáticos reanimem a economia. Mas agora, não há reanimação possível. A razão é que cada recuperação, desde 1945, estabeleceu um alto nível de endividamento. Ele está tão alto agora que estamos vivendo, desde a crise de 2008, o que chamo de deflação por dívida. As pessoas têm de pagar tanto dinheiro aos bancos que não conseguem manter o suficiente para comprar os bens e serviços produzidos. Por isso, não há novos investimentos, nem geração de emprego (exceto empregos com salários-mínimos). Os meracados estão encolhendo e as famílias estão quebrando. Por isso, muitas empresas não podem pagar os bancos.
O produto dos bancos é dívida. Eles tentam dizer aos clientes que “as dívidas são boas”, mas os clientes não podem endividar-se mais, e não há mais caminhos para que os bancos continuem seu atual plano de negocios. Na verdade, não há como os bancos serem pagos por tudo que possuem. É desse ponto que o FMI não passa. Ele não se atreve a dizer: “Os bancos estão quebrados porque o sistema financeiro também quebrou; e se isso ocorreu é porque, em seu conjunto, a ideia de tentar se enriquecer através das dívidas não funciona”.
Era um modelo falso. Estamos no final do longo ciclo que começou em 1945 e sobrecarregou as economias com dívidas. Não teremos condições de sair do labirinto até que estas seja canceladas. Mas é isso que o FMI acredita ser impensável. Não pode dizer isso, porque espera-se que represente o interesse dos bancos. Tudo o que pode dizer é que os bancos não farão mais dinheiro, mesmo que haja recuperação.
Mas na verdade não há recuperação, e não há sinais disso no horizonte, porque as pessoa têm de pagar aos bancos. É um ciclo vicioso – ou melhor, uma aspiral descendente. Basicamente, os economistas do FMI estão entregando os pontos e admitindo que não sabem o que fazer, dados os limites de seu horizonte.
Você pode nos ajudar a compreender por que o crescimento foi tão fraco nos últimos seis a oito anos?
Vamos analisar um orçamento familiar médio, estudando seus números essenciais. As pessoas pagam entre 40% a 43% de sua renda para habitação. Pagam planos de saúde, as dívidas do cartão de crédito, outros débitos. Sobram, disponíveis, apenas 25% a 35% — digamos, um terço do salário — para adquirir bens e serviços.
O problema é que quem emprega são justamente empresas que vendem bens e serviços. Elas simplesmente não estão contratando, porque os consumidores não tem dinheiro disponível para comprar esses mesmo bens e serviços. Entramos numa deflação crônica por dívida. Não há recuperação possível sem levar isso em conta. É este fato que o FMI compreendeu, mas deixa apenas implícito em seu relatório.
Ao noticiar este relatório, em manchete, o site MarketWatch afirmou: “Esqueça o [conceito de] ‘grandes demais para falir’. Os bancos estão fracos demais para sobreviver”. Na época em que eram gigantes, os bancos quase destruíram o sistema financeiro global. Bancos menores são melhores?
Pequenos bancos voltados para empréstimos ao público seriam bons. Mas os bancos, em sua maioria – o  Deutsch Bank, em graves dificuldades, é um caso típico – avaliam que não são mais capazes de ganhar dinheiro emprestando aos clientes normais. Partiram para um novo plano de negócios: emprestar dinheiro capitalistas de cassino. Isso é, emprestar para quem quer especular com derivativos.
Um derivativo é simplesmente uma aposta de que uma ação, um título de dívida ou relacionado a um ativo imobiliário irá subir ou cair. Há um vencedor e um perdedor. É como aposta numa corrida de cavalos. O maior banco envolvido nestas apostas — ou seja, não em financiar a produção, ou o investimento — era o Detsche Bank. Grandes aplicadores tomavam emprestado para jogar.
Qual é, hoje a melhor aposta no mundo? É apostar que as ações do Deutsche Bank irão cair. Especuladores tomam dinheiro emprestado do seus bancos para fazer apostas de que as ações do Deutsche Bank despencarão. Agora, ele se contorce e diz: “Oh, os especuladores estão nos matando”. Mas são o próprio Deutsche Bank e outros que fornecem dinheiro para os especuladores fazerem apostas.
O relatório do FMI diz que, na zona do euro, se os governos pudessem ajudar os bancos a se livrar de seus empréstimos ruins, isso teria um efeito positivo sobre o capital destas instituições financeiras. Qual seria o efeito sobre a população e a economia europeia?
A matemática desta proposta muito simples. Para executá-la, você teria de abolir as aposentadorias e os gastos sociais — além de aumentar os impostos. Você tem que obrigar pelo menos 50% da população europeia a emigrar — quem sabe, para a Rússia ou China… Haveria fome em massa. Muito simples: esse é o preço que alguns, na zona do euro, pensam que vale a pena pagar — e que se tentou impor à Grécia Para salvar os bancos, você teria que converter toda a zona do euro numa Grécia
Os governos teriam de vender todo o setor público — inclusive ferrovias e terras públicas. Estaríamos basicamente introduzindo o neo-feudalismo, voltando o relógio da história para trás em mil  anos e reduzindo a população da Europa para dívidas escravocratas. É a solução que a zona do euro impôs a Grécia. E a solução que os líderes e os bancos estão estão pedindo para os economistas responsáveis promoverem à população em geral.
Vamos falar a respeito de outra informação divulgada pelo FMI sobre a dívida. O endividamento global chegou recentemente a cerca de 152 trilhões de dólares. Isso inclui dívidas públicas, familiares e de empresas não financeiras. O que isso significa para o sistema financeiro global e as sociedades?
Significa que a única maneira que as pessoas têm de pagar a dívida é cortando seus padrões de vida drasticamente. Significa concordar em mudar suas aposentadorias atuais — em que você sabe quanto receberá ao deixar de trabalhar — para “planos de contribuição definida”. Nestes, você investe o dinheiro e não sabe o que receberá.
Para salvar os bancos de perdas que ameaçam varrer seu patrimônio líquido, teríamos de nos livrar da Seguridade Social. Isso significa basicamente abolir o governo para entregar o funcionamento do sistema aos bancos, com a ideia de que o papel dos governos é extrair renda da economia para pagar os acionistas e os bancos.
Quando se diz “pagar os bancos”, o que eles realmente querem dizer é pagar os dententores de títulos bancários. São basicamente o 1% mais rico. O que estamos vendo realmente neste relatório, neste crescimento de dívida, é que o 1% da população detêm aproximadamente 3/4 de todos os créditos. Significa que há uma escolha: ou você salva a economia, ou você salva o 1% de perder um único centavo.
Todos os governos, de Barack Obama até Angela Merkel, da zona do euro ao FMI, comprometem-se a salvar os bancos, não a economia. Nenhum preço é muito alto para tentar fazer o sistema financeiro ir um pouco mais longe. Ao final das contas, ele não poderá ser salvo, por causa da equação em que está envolvido. As dívidas crescem sem parar. E quanto mais crescem, mais encolhem a economia. Quando você encolhe a economia, reduz a capacidade de pagar as dívidas. É uma ilusão pensar que o sistema pode ser salvo. A questão é: por quanto tempo mais as pessoas estarão dispostas a viver nesta ilusão?
E por quanto tempo essa ilusão se sustenta antes de assistirmos a um novo colpaso econômico mundial? É algo inevitável, a que devemos simplesmente esperar? Devemos nos preparar para isso?
Ainda estamos sofrendo os efeitos do colapso que começou em 2008. Não há novo colapso, nem recuperação. Os salários dos 99% caíram, de forma constante, desde 2008. Especialmente para 25% da população que ganham menos — nos Estados Unidos, negros,  latino-americanos e outros trabalhadores. O patrimônio liquido deles ficou negativo, e eles não têm dinheiro suficiente para para pagar as contas.
Uma das maiores consultorias mundiais — a Ernst & Young — acaba de fazer o estudo sobre os muito jovens. Descobriu que 78% das pessoas que nasceram por volta da virada do século [e que têm em torno de 18 anos]  estão preocupados por imaginarem que não encontrarão empregos que lhes permitam pagar seus  empréstimos estudantis. Além disso, 74% temem não poder pagar tratamento, se ficarem doentes; 79% temem ficar sem renda suficiente para viver, quando eles se aposentarem. Toda uma geração que emerge — não apenas nos EUA, mas também na Europa — que não será capaz de ter empregos assalariados que paguem bem. O único caminho é ter pais ricos o suficiente para lhes oferecer uma renda.
Seu último livro é Killing the Host: How Financial Parasites and Debt Bondage Destroy the Global Economy [“Matando o hospedeiro: como os parasitas finaneiros e a escravidão por dívidas destroem a Economia Global”]. Você está terminando outro, certo?
Sim, nas próximas semanas. Seu título será J is for Junk Economics. Investiga por que os economistas prometem que em algum momento haverá uma recuperação. Por que isso é basicamente uma promessa impagável [junk] e por que hoje, para ser um economista, você tem que participar desse conto de fadas segundo o qual poderemos nos recuperar e, ao mesmo tempo, conservar a saúde dos bancos. Quero mostrar por que não funciona