Há dias que estava para comentar essa matéria publicada no Globo. Fato raro, aliás, esse jornal veicular texto com conteúdo de denúncia tão forte quanto às manobras para
reduzir salários e retirar conquistas de trabalhadores, principalmente quando
essas denúncias são referentes a um grupo de trabalhadores historicamente tão
contestado, como são os portuários. Mais estranheza me causou pelo texto ter
sido escrito por um parlamentar de origem sindical, caso de Paulo Pereira da
Silva.
E o texto abaixo é
corretíssimo, mas incompleto. Os portuários brasileiros estão sendo alijados de
seu trabalho não só por estarem restritos ao sistema do “porto organizado”, mas
também no art. 28 da MP:
Art. 28. É
dispensável a intervenção de operadores
portuários em
operações:
I – que, por seus
métodos de manipulação, suas
características de
automação ou mecanização, não requeiram a
utilização de mão
de obra ou possam ser executadas
exclusivamente pela tripulação das
embarcações
O trecho acima deveria
ser muito mais específico, com a relação das operações e embarcações que estariam
sujeitas a tal interpretação. Porque em outras palavras a MP é muito mais
lesiva aos portuários, uma vez que, sendo interpretativa, tal artigo abre a
possibilidade de se substituir portuários pelas já sobrecarregadas tripulações:
abram os olhos portuários e marítimos.
Além disso, a MP
continua atacando apenas um lado do problema (talvez o menor), como forma de
diminuir custos de nossas cargas, e de forma errada, buscando redução de custos
precarizando as condições dos trabalhadores, quando na verdade a maior parte
desses custos são causados pela deficiência de nosso sistema intermodal
(principalmente rodovias, ferrovias antiquadas e mal mantidas, e o modal
terrestre escolhido como principal no país: rodoviário), burocracia,
posicionamento dos principais portos (ex.: Santos é um porto dentro de um rio,
e é extremamente cara sua manutenção e ampliação para receber os grandes navios
atuais).
De bom apenas a
restrição a armadores de serem proprietários de terminais portuários, limitando
sua participação a 5%.
Quem quiser consultar o texto completo da MP antes dos vetos, clique AQUI.
De resto leiam abaixo o texto
de Paulo Pereira da Silva, ele resume nosso pensamento.
Titanic do Planalto
Tema em discussão: Modernização dos
Portos
Por Paulo Pereira da Silva
A MP dos Portos é um Titanic brasileiro.
A medida irá destruir nosso sistema portuário, precarizar as condições de
trabalho nos portos e ampliar o processo de privatização de um setor
estratégico, beneficiando grandes empresários e resultando em enormes prejuízos
para o país.
Um dos mecanismos mais perversos da MP
impacta diretamente no trabalho portuário e prejudica os trabalhadores, já que
portos privados não serão obrigados a contratar os trabalhadores inscritos no
OGMO (Órgão Gestor de Mão de Obra), o que vai resultar em perdas de direitos,
desemprego e prejuízos para as cidades portuárias.
Para evitar esse desastre, propus nas
reuniões com o relator da MP, senador Eduardo Braga - que acolheu, mas
estranhamente não incluiu no texto final -, a obrigação de utilização dos
trabalhadores registrados nos OGMOs nos portos privados. Com a rejeição da
medida no texto, os portuários ficaram prejudicados. E mais. Não há dúvidas: os
portos públicos vão quebrar, não terão como competir com os privados, que
contarão com uma série de benefícios - não pagarão outorga e não terão a
burocracia dos estados -, e os trabalhadores vão perder muitos direitos. É um verdadeiro jogo de cartas marcadas!
Infelizmente, todo o processo da MP foi
marcado pela intransigência do governo, que evitou dialogar e estabelecer um
debate democrático com as entidades do setor. Nossa luta incluiu mobilizações,
panfletagens e greves. Tivemos que invadir um navio chinês para mostrar ao país
que chineses estão ilegalmente ocupando trabalho dos nossos portuários. E foi
com esta luta e pressão que conseguimos algumas conquistas, como a manutenção
da guarda portuária, o estabelecimento de uma renda mínima e uma aposentadoria
especial para os trabalhadores em portos.
Mas também chegamos ao ponto de ser
tratados como adversários do governo a serem fulminados. Só para lembrar, como
fomos críticos ao modelo proposto na MP dos Portos, sofremos espionagem da Abin
(Agência Brasileira de Inteligência), realizada com objetivo de nos intimidar e
amordaçar o movimento sindical.
O governo usou a máquina para divulgar a
falácia de que o atual modelo de portos estava alavancando o chamado
"custo Brasil". Ora, vamos aos fatos. Só para citar um exemplo,
nossos portuários de Paranaguá (PR) recebem apenas 17 centavos para embarcar
carros que valem R$ 200 mil. Isso mesmo, 17 centavos por carro embarcado! E o
sistema funciona desta forma: o portuário pega o veículo, dirige cerca de um
quilômetro, embarca, sobe as escadas do navio de volta, caminha o mesmo
quilômetro e começa tudo de novo. Pense: 17 centavos, no valor de um bem de R$
200 mil.
Enfim, podemos definir a MP dos Portos
como um Titanic porque é algo grandioso lançado com estardalhaço e que deixará
muitas vítimas pelo caminho - no caso, a sociedade brasileira, especialmente os
trabalhadores portuários."
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