Conheci Wilen Manteli há uns oito
anos, quando estive representando a ITF em um seminário ocorrido em Vitória, e
promovido pela Federação de trabalhadores portuários que representa a
categorias como Arrumadores, Conferentes, Vigias, e algumas outras. A ideia do
seminário era discutir problemas dessas categorias e tentar apontar caminhos.
Provavelmente Manteli não se lembra de mim, já que fomos apresentados muito
rapidamente, mas eu lembro muito bem da palestra que apresentou e da forma como
na maior cara-de-pau atacou os trabalhadores portuários.
E foi isso que mais uma vez
Manteli fez no artigo abaixo. Que tenha sido veiculado em um jornal da grande
mídia, isso não nos estranha. Foi O Estado de São Paulo, mas poderia ter sido
qualquer outro. A ideia de usar tal veículo para divulgar sua posição, é criar
antipatia e uma resistência na sociedade aos portuários, e nada melhor que um
veículo da grande imprensa, e com “grande credibilidade”, para participar nesse
projeto.
E o objetivo de Manteli se
mantém. Com um discurso de que quer defender o trabalhador portuário, de que as
mudanças trazidas pela Lei 12.815 é um retrocesso na organização do trabalho
portuário brasileiro, prejudicial aos portos e terminais e, por conseguinte,
aos portuários mesmos.
Portanto analisemos suas colocações:
a primeira é a obrigatoriedade de recrutamento de trabalhadores do Ogmo, quando
na Conv. 137 da OIT, isso é apenas preferencial. Assim como quando querem
contratar a vínculo por prazo indefinido, essa preferência também existe.
Acontece que no Brasil os operadores portuários utilizam a prática de oferecer
salários irrisórios para os trabalhadores do Ogmo, quando querem contratar por
tempo indeterminado, o que obviamente leva os trabalhadores a rejeitar os
empregos e os empregadores se acham no direito de buscar trabalhadores NÂO
SINDICALIZADOS no mercado.
Outra questão é a do treinamento
e idade dos trabalhadores. Primeiro, que a grande maioria dos terminais vem se
recusando a dar o treinamento adequado aos trabalhadores há tempos. Tal não
acontece quando se tratam de trabalhadores de fora do Ogmo. Mesmo assim o
treinamento dado é normalmente o básico, já que a grande ideia é não investir
em treinamento, já que essa rubrica é tida pela maioria dos empregadores como
despesa, e obrigação do trabalhador. Quanto à idade dos trabalhadores, essa é
apenas uma desculpa para não fazerem o que já não fazem. Também desculpa para
que se desmobilizem os Ogmos, ficando apena com os trabalhadores necessários
para garantir os trabalhos em momentos de pico de movimento dos portos, quando
os quadros permanentes dos terminais se vêm sobrecarregados.
Da mesma forma trata a questão da
garantia de ganho mínimo aos trabalhadores portuários. Algo que os empregadores
sempre se recusaram a dar, também tentam imputar a culpa nos trabalhadores pela
não implantação desse direito, devido ao inchaço nos quadros dos Ogmos, ou
seja, outra vez culpa dos trabalhadores.
Por último o cerne da questão: os
sindicatos. Manteli é claro quando diz que os empregadores não querem negociar
com os sindicatos existentes. Não por serem muitos ou por isso entravar as
negociações. Isso é assim há pelo menos 100 anos. Os sindicatos que representam
as categorias portuárias têm quase todos essa idade. Foram dos primeiros
sindicatos do país, participaram e promoveram as primeiras greves. São
combativos até hoje.
E é isso que Manteli quer evitar:
combatividade. O que Manteli quer é negociar com sindicatos novos,
inexperientes, pouco representativos, pois seus trabalhadores estão portuários,
mas podem deixar a beira do cais a qualquer momento. Enfim, o que ele quer é
negociar com sindicatos fracos, que colocarão pouca ou nenhuma resistência,
para que os empregadores imponham baixas condições financeiras, sociais, de
segurança e de higiene em Acordos Coletivos que darão “respeitabilidade” às
relações trabalhistas no porto, mas que no fundo não passarão de fachada.
O Blog dos Mercantes só concorda
com Manteli em um ponto: a Lei 12.815 errou. Ela deveria ter estendido os
direitos acima e a obrigação do uso de trabalhadores oriundos do Ogmo a todos
os trabalhadores portuários e a todos os terminais, e não apenas aos
estabelecidos no chamado porto público.
Bom, é direito dele defender seus
interesses, e é nosso denunciar suas falácias.
Em defesa do trabalho portuário
Por Wilen Manteli
Pressões
sindicais levaram o Congresso Nacional a inserir no novo marco regulatório do
setor portuário mudanças que terão impacto econômico negativo, especialmente
nos portos públicos. O texto final da Lei n.º 12.815 restabeleceu o monopólio
sindical do trabalho avulso, que havia sido extinto pela lei anterior (n.º
8.630/1993). Três dispositivos consumaram esse retrocesso: a proibição de
recrutar, mesmo para vínculo empregatício, qualquer trabalhador não pertencente
aos quadros do Órgão Gestor de Mão de Obra (Ogmo); a elevação de todos os
segmentos do trabalho portuário avulso à condição de categorias diferenciadas;
e a permissão para que trabalhadores aposentados permaneçam nos quadros do
Ogmo. Esse conjunto de alterações configura um retorno aos anos 1940.
A
obrigatoriedade do recrutamento no Ogmo de trabalhadores que até então as
empresas podiam buscar no mercado, treinando-os sob medida para suas
necessidades, fere a liberdade de contratar consagrada na Constituição, além de
dificultar a formação de equipes afinadas, capazes de atuar como um time focado
em resultados. A estratificação e a constituição dos avulsos em categorias
diferenciadas, por sua vez, deixarão os portos brasileiros mais distantes da
multifuncionalidade - meta indispensável à integração operacional porto-navio
-, tornando o trabalho mais complexo, demorado e caro, pela impossibilidade de
se implantar um comando único. Essa fragmentação irá, ainda, acirrar conflitos
sindicais com os terminais privados, pois, na falta de um sindicato
preponderante, as empresas serão obrigadas a negociar com cada uma das seis
categorias de trabalhadores avulsos. O trabalhador mais jovem, justamente
aquele com maior potencial para a multifuncionalidade, ficará engessado dentro
de sua categoria, com chances limitadas de ascensão profissional.
O
trabalhador avulso que se aposentar poderá permanecer no Ogmo, inchando
continuamente o seu contingente e inviabilizando programas avançados de
capacitação, uma vez que as empresas não terão interesse em custear treinamento
para profissionais em fim de carreira ou sem condições de trabalhar. Um quarto
dispositivo - o da garantia de renda mínima, que em princípio seria justo para
com os trabalhadores -, articulado com os demais, servirá somente para elevar o
custo da movimentação portuária, sem contrapartida em aumento de produtividade.
A garantia da renda mínima deveria ser considerada somente após o atendimento
das demais recomendações da Convenção n.º 137 da Organização Internacional do
Trabalho (OIT), firmada em 1973 para atenuar os efeitos sociais da automação
das operações portuárias.
Muito
citada, mas pouco respeitada no Brasil, a Convenção n.º 137 determina que os
portuários registrados tenham prioridade no acesso ao trabalho e que estejam
disponíveis para trabalhar de acordo com a legislação ou a prática nacionais
(art. 3.º); e recomenda que os quadros profissionais sejam periodicamente
revistos conforme as necessidades do porto (art. 4.º). A OIT propõe,
estabelecido nos portos brasileiros.
Cabe ao
governo a responsabilidade de administrar os conflitos que inevitavelmente
virão. Será necessário criar um estímulo para o cancelamento da matrícula no
Ogmo, por meio de negociações em cada região portuária entre governo,
empresários e trabalhadores. Dessa forma, sim, estaremos atendendo à Convenção
n.º 137 da OIT, que se aplica, expressamente, "às pessoas que trabalham de
modo regular como portuários, e cuja principal fonte de renda anual provém
desse trabalho" (art. 1.º). Não há melhor garantia para o trabalhador do
que a qualificação técnica permanente. A postura do governo diante das relações
entre capital e trabalho nos portos terá grande relevância para definir se
continuaremos atados a práticas do passado ou se estamos dispostos a encarar os
desafios do século 21.
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