A crise de 2008 segue forte no mundo, e até o presente momento não temos uma luz no final desse longo e tenebroso túnel. O caso da falência da Hanjin Shipping é o mais grave já registrado no planeta, quando falamos de Marinha Mercante, mas é também um sintoma muito claro de que estamos ainda em um momento de indefinições sobre o futuro da economia mundial.
Quanto à marinha mercante especificamente, podemos tirar algumas lições valiosas de todo esse processo. O primeiro é que mão de obra barata não é garantia de lucros. Ao contrário, muitas vezes causa grandes prejuízos.
Outra lição para que entendam, é a confusa e entrançada teia de investimentos e interesses comerciais que existem no transporte marítimo, onde muitas vezes não está claro quem é o responsável por custos, quem é proprietário, ou mesmo quem é beneficiário das operações. Isso causa uma enorme dificuldade em cobrar e responsabilizar os operadores e beneficiários do setor.
Por último, mas mais importante, está a mão de obra marítima usada na Marinha Mercante internacional, que comumente vem de países pobres, fornecedores de mão de obra barata, e normalmente não tem nenhuma garantia de recebimento de seus salários, ou mesmo de condições mínimas de habitabilidade a bordo das embarcações.
O mundo precisa urgentemente rever alguns conceitos sobre custos x trabalhadores.
Informativo dos Portos – Reportagem – 12/09/2016
Os 540 mil contêineres que não podem desembarcar em nenhum
porto
Cerca de 540 mil contêineres estão sem destino em alto-mar.
E isso não se deve a um erro de navegação, mas sim à falência
da maior companhia de transporte marítimo da Coreia do Sul, a Hanjin
Shipping.
Sua frota – incluindo embarcações, marinheiros e carga –
está em uma espécie de limbo, já que, temendo calotes, os portos não deixam
navios da Hanjin atracarem ou descarregarem.
Os navios são, dessa forma, obrigados a esperar que a Hanjin
e seus credores ou sócios entrem em um acordo. É um caso sem precedentes, e
especialistas acreditam que o impasse pode se estender por semanas ou até
meses.
“É um grande desastre para as companhias de transporte
marítimo e para as proprietárias das mercadorias que estão nos
contêineres”, disse à BBC Greg Knowler, analista marítimo e comercial da
empresa IHS Markit, com sede em Hong Kong.
Alta temporada
Além de impedir que os navios descarreguem, os portos também
estão retendo contêineres já desembarcados da Hanjin como garantia de
pagamento das dívidas da empresa.
E, mesmo se os portos liberarem a entrada dos navios, a
Hanjin provavelmente impediria que estes atracassem, já que eles seriam
tomados imediatamente pelos credores.
No mês de setembro, a indústria global de transporte
marítimo costuma estar em seu momento mais ativo do ano, antes da temporada
de Natal.
Por isso, um dos problemas com o limbo marítimo é a carga
guardada dentro dos contêineres, muitas vezes ansiosamente aguardada por
seus compradores.
“São (no total) cerca de 540 mil contêineres com carga
retidos no mar”, explicou à BBC Lars Jensen, presidente-executivo da
Consultoria Sea Intelligence, com sede em Copenhague, na Dinamarca.
Grande parte dessas mercadorias tem como destino final os
EUA, na época de maior movimento comercial, o fim do ano, e qualquer
interrupção será uma grande dor de cabeça para as empresas que apostaram na
Hanjin para entregar seus produtos.
Donos
A estrutura da propriedade de navios dentro da Hanjin é um
pouco confusa.
A empresa opera em parte com navios próprios e também com
navios alugados. Alguns dos navios retidos no mar são, na verdade, de outras
companhias, que temem não conseguir recuperar a posse das embarcações ou
receber o dinheiro correspondente ao aluguel desses cargueiros.
Os contêineres a bordo tampouco são todos da Hanjin. Como a
empresa é parte de um grupo que inclui outras quatro empresas de transporte
marítimo, cada navio tem contêineres de variados donos.
E, por fim, existem as donas do conteúdo dos contêineres –
caso de uma empresa de produtos eletrônicos asiática que despachou sua
mercadoria para o mercado americano.
A falência da Hanjin é a maior que já atingiu o setor de
transportes marítimos, ou seja, não há precedentes ou indicativos de o que
pode acontecer agora. Pelo menos não em uma escala que possa ser comparada.
Presos em portos
Isso nos leva ao problema seguinte: os contêineres retidos
em portos espalhados pelo mundo.
Um exemplo é o de um contêiner das Filipinas que estava a
caminho de Hong Kong. Ele seria recolhido posteriormente em Hong Kong e
levado para os Estados Unidos.
O manejo da carga em Hong Kong custa dinheiro. Se a Hanjin
não pagar por isso, o porto vai reter o contêiner como garantia até que
alguém pague a conta.
Uma solução possível seria a de companhias que são donas das
cargas dentro dos contêineres pedirem para outras empresas de transporte
marítimo assumirem o transporte a partir de onde a Hanjin teve que
abandonar.
O custo seria duplicado, já que o que foi pago a essas
empresas já havia sido pago à Hanjin. Mesmo descontando o que seria coberto
por seguradoras, a operação seria consideravelmente encarecida.
Presos no mar
E próximo problema é o dos contêineres a bordo dos navios.
Enquanto estiverem no mar, não há como retirar a carga deles.
No caso dos navios que foram apenas alugados pela Hanjing,
os verdadeiros donos podem recuperar o controle das embarcações e e
atracá-las.
As cargas ainda teriam que ser retiradas mas, depois disso,
os navios poderiam ser alugados para outras empresas.
Dado que os donos das embarcações alugadas provavelmente não
vão querer pagar a conta sozinhos, eles poderiam tentar envolver as quatro
empresas parceiras que também têm contêineres nos navios ou talvez até
chamar as empresas que têm cargas presas nas embarcações da Hanjin.
Os navios que são da Hanjin provavelmente terão que ser
vendidos antes que qualquer um pague para que eles atraquem em algum porto
e as cargas sejam retiradas. O imbróglio provavelmente jogará o preço das
embarcações para baixo.
Marinheiros
Por fim, discute-se o que fazer com as tripulações. Em cada
navio preso nesse limbo há entre 15 e 25 pessoas a bordo. Os marinheiros
enfrentam o temor de ficarem retidos no mar durante semanas, além da
incerteza em relação a seus salários.
Sem conseguir atracar em nenhum porto, eles dependem dos
suprimentos e do combustível dentro dos navios até que o impasse seja
resolvido.
Se os navios não tiverem dinheiro para pagar por combustível
cedido por outras embarcações, os portos mais próximos seriam obrigados a
aceitá-los.
A maioria dos tripulantes não é contratada diretamente pela
Hanjin, mas através de agências. E estas agências provavelmente não serão
pagas pela Hanjin e, por isso, não conseguirão pagar os marinheiros.
“A não ser que alguém assuma (a dívida) muito rápido – e não
há sinais de que isso vai acontecer -, (o impasse) pode durar muito tempo”,
alertou Jensen.
Navios, carga e tripulação podem ficar à deriva por semanas
ou meses, sem saber quando e onde suas viagens vão terminar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário