O discurso do Ministro do STF, Gilmar Mendes, está afinadíssimo com os preceitos do Estado Democrático de Direito. Agora é só praticar.
Ministro
do Supremo Tribunal Federal reage a vazamento de informações sobre
delaçãode empreiteiro que atinge seu colega da Corte, Dias Toffoli, e
alerta que 'quando há concentração de poderes cometem-se abusos
Fausto
Macedo e Julia Affonso
23 Agosto 2016 | 14h26
Gilmar Mendes. Foto: André Dusek/Estadão
O
ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, disse nesta
terça-feira, 23, que ‘é preciso colocar freios’ na atuação dos
procuradores da República. Ele não citou nomes, mas se referiu
diretamente a procuradores da Operação Lava Jato.
A fala do ministro é a mais contundente manifestação já disparada por um membro da Corte máxima contra os procuradores.
Gilmar
Mendes se revela indignado com o que classifica de vazamento de
informações sobre a delação do empreiteiro Léo Pinheiro, da OAS.
O
executivo, segundo a revista Veja, revelou detalhes de uma obra na
residência do ministro do STF Dias Toffoli, ex-advogado do PT e amigo de
Gilmar Mendes. A obra teria sido realizada pela OAS, alvo da Lava Jato
por cartel e corrupção na Petrobrás.
Para
Gilmar, o vazamento seria um ‘acerto de contas’ de procuradores porque
Toffoli os teria contrariado ao mandar soltar o ex-ministro Paulo
Bernardo (Planejamento) e ‘fatiado’ a investigação sobre a senadora
Gleisi Hoffman (PT/PR) na Lava Jato.
“O
fatiamento por ele (Toffoli) decretado e esse habeas corpus no caso do
Paulo Bernardo (ex-ministro preso em julho na Operação Custo Brasil, mas
solto por ordem de Toffoli), isso animou os procuradores a colocar
artigo no jornal e coisas do tipo”, diz Gilmar.
“Como eles (procuradores) estão com o sentimento de onipotentes decidiram fazer um acerto de contas.”
“Decidiram vazar a delação (de Léo Pinheiro, da OAS), mas tem que se colocar um limite nisso.”
“Quando
você tem uma concentração de poderes você tende a isso, a que um dado
segmento, que detém esse poder, cometa abusos”, afirma o ministro do
Supremo.
“Não
há nenhuma censura imputável ao ministro Toffoli, mas tudo indica que
ele está na mira dos investigadores. Em razão, provavelmente, de
decisões que (Toffoli) tem tomado e os têm desagradado.”
“Se é isso, temos que prestar muita atenção. Há o risco de se tornar algo policialesco”, declarou Gilmar.
“No
contexto de incensamento da Lava Jato e seus operadores já há coisas
muito, vamos dizer assim, exageradas”, avalia o ministro.
“Por
exemplo, isso (a Lava Jato) os animou a apresentar essas propostas de
combate à corrupção (projeto 10 Medidas, em curso no Congresso). Ninguém
é a favor da corrupção. Mas, vejamos, a proposta de que prova ilícita,
obtida de boa fé, deve ser validada, a priori, tem que ser muito
criticada e se negar trânsito. Imagine, agora, um sujeito que é
torturado, ah, mas foi de boa fé.”
Gilmar
Mendes citou o caso do delegado Protógenes Queiroz, da Operação
Satiagraha – deflagrada em 2008 -, que foi expulso da Polícia Federal
por violação de sigilo funcional.
“Isso
lembra o nosso delegado herói, que fazia interceptação telefônica sob o
argumento de que agia com bons propósitos. Ora, espera aí. A autoridade
se distingue do criminoso porque não comete crime, senão é criminoso
também! Aí vira o Estado de Direito da barbárie.”
“Estado
de Direito tem que ser Estado de Direito. Não se combate crime com a
prática de crime. É preciso moderação, que os procuradores calcem as
sandálias da humildade.”
“Eu
vi outro dia na TV uma procuradora da República falando que o Congresso
tem que aprovar o projeto (10 Medidas) porque teve o apoio popular
(mais de dois milhões de assinaturas). Ora, de onde tiraram essa
autoridade, essa legitimidade? Como assim, o Congresso tem que aprovar o
pacote todo!. Depois será um desastre em termos de aplicações.”
O ministro disse que ‘o recado está dado’.
“Isso
não vai prosseguir assim, a gente tem instrumentos para se colocar
freios. É preciso colocar freios nisso, nesse tipo de conduta. No caso
específico do ministro Toffoli, provavelmente entrou na mira dos
investigadores por uma ou outra decisão que os desagradou.”
“Isso já ocorreu antes no Brasil. O cemitério está cheio desses heróis.
Mesmo no elenco dos procuradores. Ninguém pode esquecer de Guilherme Schelb, Luiz Francisco e tantos mais (procuradores da República que foram acusados de abusos). Estamos preocupados, mas está dado o recado.”
Mesmo no elenco dos procuradores. Ninguém pode esquecer de Guilherme Schelb, Luiz Francisco e tantos mais (procuradores da República que foram acusados de abusos). Estamos preocupados, mas está dado o recado.”
“Se houver exagero alguém tem que puxar. O tribunal (STF) tem mecanismos para fazer valer a lei. ”
Gilmar Mendes considera que ‘há uma falta de coordenação’.
“Vejamos
a própria estrutura da Procuradoria. Ela não dispõe de uma estrutura de
coordenação. Isso leva às vezes a esses exageros.”
“Por
outro lado, estão muito avançados nas investigações. Eles dispõem de
informações e têm a mídia como numa situação de dependência. A mídia
está hoje em relação aos investigadores como um viciado em droga em
relação ao fornecimento da substância entorpecente.”
“Isso
precisa ser colocado nos seus devidos termos. Vazamento tem em todo
lugar. No caso do ministro Toffoli, a responsabilidade é clara da
Procuradoria como um todo.”
“A concentração de poderes é um risco. Depois não querem a Lei do Abuso de Autoridade. É muito curioso.”
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