Interessantíssima a entrevista com Jean-Jacques Kourliandsky, O pesquisador do IRIS (Instituto de Relações Internacionais e Estratégicas), e que é responsável pela América Latina no Instituto, dá uma aula de política e de entendimento do mundo atual. Infelizmente às vezes é antagônico, como quando analisa e critica a idade dos "representantes da Frente de Esquerda Uruguaia", ou da esquerda chilena. Aí quando fala de Lula, se esquece de que ele está na mesmíssima faixa etária, e que tampouco soube, ou quis, criar sucessores para seu legado.
Isso mostra que tem amplo domínio sobre o macro cenário da política latinoamericana e mundial, mas se perde quando analisa os desdobramentos da micro política. Isso fica explícito ao assumir alinhamento com o PT, que deve ser a fonte em que bebe da política brasileira, como também pelo distanciamento físico e pela amplidão de sua área de pesquisa. A América Latina é tão grande quanto diferente entre suas inúmeras regiões.
Ai vem seu erro em relação à micro política. Ciro Gomes jamais deixou de ser solidário a Lula, Ciro Gomes jamais deixou de apoiar Lula quanto a sua prisão arbitrária, mas isso não significa cometer um suicídio político, isso não significa deixar de apontar seus erros, e muito menos parar sua vida para defender Lula. Claro que Ciro disse que sem Lula a eleição se torna aberta. Não somente por ele, mas porque as forças de direita também deixam de estarem submetidas ao acirramento que a presença do líder petista provoca. Por último Ciro afirmou que sua candidatura depende somente da indicação de seu partido, mas que não gostaria de concorrer contra Lula, justamente pelo acirramento de paixões que sua presença provoca.
Outro ponto muito interessante é o desaparecimento do Brasil como nação do cenário mundial. Depois de ser o "queridinho" do mundo na primeira década do século, o país caiu durante os governos Dilma, e desapareceu durante o desgoverno do usurpador. De um líder regional ativo e que ganhava espaço e importância globalmente, o Brasil simplesmente deixou de ser considerado, tornando-se um mero penduricalho de outras potências mundiais.
E isso é apenas constatação factual.
A entrevista é longa, mas vale ser lida na íntegra. O link está no título da matéria abaixo.
Um país que não perdeu a relevância, mas a existência internacional. Para Jean-Jacques Kourliandsky, 70, foi isso que aconteceu com o Brasil. O historiador aponta além da ruptura de política externa, o agravamento da crise interna, com mais desemprego, violência e à beira de ser comandado pela extrema direita. Segundo ele, o cenário atual era inimaginável dois anos atrás, mas é um produto da campanha midiática contra a política e de uma justiça que funciona a duas velocidades, lenta demais com as lideranças de direita; muito rápida e severa com a esquerda. A prisão de Lula, afirma, é parte fundamental desse processo.
A judicialização da política, aponta, é o nova tática da direita para tomar o poder, não só no Brasil, mas em diversos países do mundo. Pesquisador no IRIS (Instituto de Relações Internacionais e Estratégicas) e responsável pelo Observatório da América Latina da Fundação Jean-Jaurès, financiada em grande parte pelo Estado francês, ele me recebe na fundação política, de corrente socialista, localizada no bairro de Pigalle, em Paris, um lugar cheio de crianças, adolescentes, turistas, artistas, e onde fica o Moulin Rouge. O que é fundamental para a esquerda na “democracia de exceção” que se tornou o Brasil? Ele responde nessa entrevista.
DCM – Por que você se interessou em estudar o Brasil e a América Latina ao longo de sua vida?
Jean-Jacques Kourliandsky – Ele veio pela Espanha. Eu nasci no sudoeste da França, perto da fronteira espanhola. Então eu e meus amigos da faculdade íamos com frequência à Espanha para festejar. Nessas ocasiões, eu encontrava uruguaios, refugiados, que me procuravam. Eles sabiam que naquele momento eu trabalhava em Paris. Eles queriam a minha ajuda para constituir um comitê de apoio para libertar o general Liber Seregni, que foi o primeiro presidente da Frente Ampla do Uruguai. Naquela época, nos anos 1979, 1980, os estrangeiros não podiam presidir ONGs. Eles precisavam de alguém um pouco idiota (risos), que não conhecesse bem o Uruguai, para presidir esse comitê.
Foi o que eu fiz, por dois ou três anos. Progressivamente, eu saí da minha inocência. Eu pesquisei sobre o Uruguai, estudei. Comecei a escrever. A partir desse momento, além do Uruguai, fui à Argentina, ao Paraguai, ao Brasil, ao Chile. Praticamente todo ano, passei cinco ou seis semanas em um país diferente. Eu tenho uma formação universitária, mas nesse caso, me formei um pouco como um jornalista, um autodidata. Tentei ter um conhecimento pessoal, sem ter apoio um apoio específico. Como eu não tinha os meios financeiros para conhecer a América Latina, eu busquei a mídia, o IRIS, para fazer pesquisa, para poder pagar parte dessas viagens. Então, ao longo dos anos, fui umas vinte vezes ao Brasil, à Argentina, ao México, à Colômbia…
Por que você diz que eles precisavam de um “idiota” para presidir a Comissão?
Na Frente Ampla, há mais de 20 partidos diferentes. Eles têm um modo de funcionamento particular. Eles conseguem chegar a um consenso. Mas antes do consenso, tem muita disputa. Então, não era para os franceses se misturarem a essas disputas. Era necessário um francês que nao soubesse de nada (risos).
Por que o Brasil é um país decisivo, segundo a Fundação Jean-Jaurès?
Independentemente do interlocutor na França, o Brasil é considerado de uma forma diferente da República Dominicana ou de El Salvador. Éum estado que, pelo seu tamanho, suas potencialidades, interessam muitas pessoas na França e na Europa. É uma questão de escala. Em relação àqueles que estão na corrente progressista, o nascimento da CUT, o nascimento do PT foram sempre acompanhados com muita atenção aqui. Houve o orçamento participativo em Porto Alegre; a corrente dos cristãos de esquerda, a Teoria da Libertação; o Movimento dos Sem Terra; há muitas coisas que fazem com que diferentes correntes de esquerda se interessem pelo Brasil. No campo econômico, as empresas certamente se interessam pelo Brasil, porque tem 200 milhões de habitantes. Aos diplomatas interessa porque o Brasil é quase 40% da América Latina. Há razões objetivas, ideológicas, econômicas, geográficas, há muitos vieses possíveis para despertar o interesse dos não brasileiros. Não quero fazer nenhum comentário desmerecedor, mas há mais razões que os façam se interessar pelo Brasil do que pelos países da América Central ou pelo Paraguai.
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