William Shakespeare deve estar se revirando no túmulo com o infame trocadilho de nosso título, mas não há chamada melhor para definir o momento delicado e duvidoso pelo qual passamos todos, na Marinha Mercante. Muito se há comentado a bordo, muitos têm dúvidas, e principalmente não compreendem a situação. Tenho ouvido comentários, os mais variados, todos demonstrando apenas desconhecimento e um receio do novo, do diferente. Nada mais humano, mas também, nada mais perigoso.
Acusações e cobranças são o mais comum de se ouvir. Mesmo companheiros com alto nível cultural demonstram desconhecimento de nosso mercado de trabalho e das condições, com as quais temos que matar um leão por dia para manter-nos. E quando falo “temos”, falo de todos nós através de nosso sindicato, que organiza, lidera e é, em verdade, o resultado de nossos esforços e união.
Sim, o sindicato somos nós.
Por mais que queiramos passar aos dirigentes sindicais todas as nossas responsabilidades, o melhor que conseguimos é uma estagnação em nossos avanços, porque não se pode imputar a outros, aquilo que nos é inerente.
Outra que já ouvi é que as leis e normas no Brasil não pegam. Que não podemos contar com elas porque não são aplicadas. Na verdade o que há é o interesse da população e/ou do governo em aplicá-las ou não.
Temos ótimos exemplos de leis que estão sendo implantadas de forma intensiva e eficiente, como a Lei Seca para motoristas, e o uso do cinto de segurança, ou a lei contra a segregação racial, apenas para ficar com algumas bastante conhecidas.
Hoje temos nossos postos de trabalho garantidos por duas rns do Conselho Nacional de Imigração (CNI), que são as rn-72 e rn-80. Essas resoluções normativas, assim como a taxa celic de juros é definida pelo Conselho Monetário Nacional. Essas rns são baixadas, mantidas, alteradas, ou extintas, por simples reuniões dos membros que compõe o CNI. Não são leis e não existiam há alguns anos e não há nada que garanta que continuem a existir.
Então nossos empregos não estão garantidos em lei, como muitos pensam.
Um pouco mais além. Qualquer lei pode ser alterada por um simples decreto, ou seja, uma simples assinatura e publicação no diário oficial da União revogam, ou alteram qualquer lei. Mais uma vez não teríamos garantia de nossos empregos, mesmo que esse fosse por lei.
Então não temos garantia de nossos empregos?
No momento sim, porque nossas leis e normas (que não pegam) vêm garantindo nossos empregos. A questão é que os armadores, na sua imensa maioria estrangeiros, que estão acostumados ao altíssimo lucro da exploração da bandeira de conveniência e de seus marítimos muito mal remunerados, com condições a bordo muito aquém das que poderíamos sequer supor, vêm se unindo de forma clara e inequívoca no sentido de baixar nossos salários, nossas condições sociais e mesmo substituir-nos, como forma de impedir qualquer tipo de reação.
As reclamações pela queda nas condições econômicas e sociais do pessoal embarcado já se fazem presente a bordo. A intransigência dos armadores do offshore em assinar um acordo coletivo de trabalho digno é apenas uma das consequências de sua nova postura. Eles estão unidos, através de seu órgão de classe, para aumentar seus lucros através do aviltamento de nossas conquistas. Nós vamos ficar parados, olhando tudo aquilo que conquistamos ser retirado?
O SINDMAR, Sindicato dos Oficiais de Náutica, Máquinas e Eletricistas Mercantes, não é o sindicato dos marítimos. Infelizmente os marítimos no Brasil estão divididos em uma série de sindicatos, alguns regionais, outros nacionais, e isso diminui nossa força. Mas o SINDMAR, com a união nacional de 3 das categorias mais representativas, vêm alterando esse quadro. Assim nada mais óbvio que se queira quebrar este sindicato específico. Ele vem liderando as conquistas de todos os marítimos, como o regime de embarque de 28x28, ganhos salariais acima da inflação, e a garantia de nossos empregos, apenas para ficarmos em coisas bem palpáveis.
Cabe à diretoria empossada em um sindicato analisar e organizar a luta por melhores condições de trabalho, e em tempos de globalização, pelos postos de trabalho em si; mas cabe à sua base decidir os caminhos a serem seguidos. A diretoria analisa a situação, aconselha e sugere ações, a base, de forma democrática decide.
E aí cabem as perguntas: nós vamos assistir passivamente que nos retirem tudo que conquistamos, para voltarmos ao marasmo do início e meado dos anos 90, quando a maioria de nós ficou desempregada, e muitos migraram para navios bdcs ou outras carreiras?
Ou nós vamos brigar para mantermos nossos postos de trabalho? Nós vamos brigas pelas condições, que com muita luta conquistamos através dos anos? Nós vamos brigar pela nossa Marinha Mercante?
Todos conhecem as condições que temos a bordo de embarcações brasileiras, e o blog vem mostrando as condições facilmente encontradas em embarcações bdcs, com as quais pretendem invadir de vez nossa costa.
Quem decide é a base! Se não formos à greve essa será a decisão dos homens e mulheres da Marinha Mercante brasileira. e se formos à greve, essa será a greve dos homens e mulheres da Marinha Mercante brasileira.