Bom o texto
publicado em julho pelo jornal O Globo (leia abaixo), complementando outro texto veiculado no
mesmo veículo cerca de um mês antes. Bom
porque nos trás novamente uma série de dados e informações importantes, e bom
porque podemos trabalhar o pensamento sobre ele.
Mais uma
vez vemos constatada a economia que se poderia ter pela simples troca do modal
prioritário, de rodoviário para hidroviário. Em cerca de 3 anos teríamos os
investimentos pagos. Isso sem contar que as economias previstas são em cima de
nosso nível atividade econômica atual, e um modal de transporte mais barato
criará novos investimento, empregos e melhorará significativamente nossa
competitividade no comércio exterior.
Os
investimentos são certamente altos, mas valem muito a pena. Além disso, são
muito mais baixos do que os investimentos para construções de rodovias e
ferrovias, já que como é amplamente divulgado, nossos rios são naturalmente
navegáveis, bastando para isso obras pontuais de dragagem e manutenção.
Por outro
lado temos a declaração infeliz do presidente da Empresa de Planejamento e
Logística, de que nossas hidrovias são muito periféricas e por isso não são prioritárias,
citando para isso o caso do Rio Mississipi nos EUA.
O rio
citado como modelo na reportagem de O Globo, embora muito bem localizado no
centro do país norte-americano, só é amplamente navegável devido à intervenção
humana, grande parte dela ocorrida na década de 30 do século passado. São nada
menos que 27 barragens e comportas, além da construção de uma série de lagos
artificial e de manutenções constantes em seu canal navegável, já que o rio
recebe sedimentos de duas importantes cadeias de montanhas, os Apalaches e as
Rochosas, o que sedimenta e altera constantemente e acentuadamente o seu delta.
Mas se tudo
isso não bastasse o Mississipi ainda se encontra em uma área de atividade
sísmica importante (a Falha de New Madrid), o que pode alterar repentinamente
seu curso e danificar seriamente as obras que o tornaram navegável.
Nossas
hidrovias estão realmente posicionadas nos “extremos” do país, mas próximas a
nossas fronteiras agrícolas, atravessam extensas áreas já exploradas
economicamente e tem a capacidade de levar mais desenvolvimento ao interior do
país, já que nossa indústria está prioritariamente localizada próxima à costa.
Mas quando
se ve que nosso governo prefere construir uma ferrovia percorrendo o mesmo
percurso de uma possível hidrovia, possivelmente a custo bem superior ao da
adaptação do rio à navegação, percebemos o viés da decisão puramente política.
Os motivos
que levaram a tal decisão podem ser muitos, mas certamente não levaram em conta
o custo dos investimentos e os benefícios a médio e longo prazo dos mesmos.
O mesmo se
passa com nossa Marinha Mercante, que se ve atravancada por uma série de
impostos e barreiras legislativas (de ordem alfandegária) na movimentação de
cargas, que impedem seu pleno desenvolvimento.
O não
desenvolvimento de ambos os setores significa aumento de custos, diminuição de
nossa competitividade econômica no comércio exterior, menos empregos e menos
oportunidades ao país.
Leia:
O incerto
curso das hidrovias no Brasil
Por Henrique
Gomes Batista
Empresas
querem investir no segmento, que pode gerar economia de R$ 3,7 bi por ano, mas
governo não vê prioridade
RIO - O
desenvolvimento das hidrovias no Brasil está em uma encruzilhada. Empresários
se interessam em investir no setor e planejam aumento expressivo de seu uso, o
que poderia eliminar pelo menos 450 mil viagens de grandes caminhões nas
congestionadas estradas brasileiras em 2016. Para empresários e especialistas
em logística, os rios são ótimas alternativas para escoamento, sobretudo, da
produção de grãos. Mas o governo afirma que o segmento não é prioritário e
prefere focar na construção de ferrovias — algumas seguem o trajeto de rios que
poderiam ser navegáveis com obras de eclusas (“elevadores” para barcos em rios
com desníveis) e dragagens.
Se fizer a
opção pelos rios, dizem os especialistas, o país deixará de desperdiçar, no
mínimo, R$ 3,7 bilhões por ano com uma logística mais eficiente, barata e
ecologicamente correta. Mas, mesmo com o Brasil atrasado décadas em relação a
outros países, autoridades veem as hidrovias como auxiliares:
— Hidrovia
não é solução estrutural para o transporte brasileiro, não temos um Rio
Mississippi. No Brasil as hidrovias são muito periféricas, não passam por
grandes centros produtores ou consumidores. A prioridade é criar uma malha
ferroviária mais robusta — diz Bernardo Figueiredo, presidente da Empresa de
Planejamento e Logística, responsável pelo novo modelo de transportes do país.
Rio Tocantins
pode ser privatizado
Ainda que a
hidrovia não seja o foco, o governo estuda uma inédita concessão à iniciativa
privada, para tornar o Tocantins navegável. Segundo Figueiredo, o projeto está
em elaboração e será concluído até o fim do ano. A proposta é criar uma
concessão administrativa. Ou seja, em vez de cobrar pedágio, a empresa assume
obras e faz a manutenção da hidrovia. Em contrapartida, recebe pagamento do
governo pelo trabalho executado.
Este projeto,
piloto, poderá incentivar soluções para as demais hidrovias consideradas pelo
governo, nos rios Madeira/Amazonas (Norte), Tietê-Paraná (Sudeste/Paraná),
Lagoa dos Patos (RS), São Francisco (Nordeste) e Tapajós, entre Miritituba e
Santarém, no Pará. Mas Figueiredo não dá muitas esperanças a quem imagina um
programa mais ousado, como a ampliação da hidrovia do Tapajós até o Mato
Grosso, maior produtor nacional de grãos.
— Temos que
ver o custo-benefício. No caso, já planejamos uma ferrovia entre Cuiabá e
Santarém — afirma, lembrando que o governo ainda tem dificuldades para incluir
as obras das eclusas em hidrelétricas futuras. — O custo dessas eclusas não
pode entrar no total da hidrelétrica, que é a base da tarifa da energia.
Estamos conversando com a EPE (Empresa de Planejamento Energético), mas ainda
não temos uma solução.
Renato Casali
Pavan, presidente da consultoria Macrologística, lembra que se o Brasil optasse
pelos rios, a economia com uma logística mais barata e eficiente chegaria a R$
3,7 bilhões por ano, considerando-se apenas o Tocantins (R$ 1,7 bilhão) e o
Jurena-Tapajós (R$ 2 bilhões). Para isso, seriam necessários R$ 9 bilhões em
investimentos, incluindo as eclusas das novas hidrelétricas, para que estes
rios fossem navegáveis até o Mato Grosso.
Mas fontes do
setor e do governo alertam que a possível concorrência entre modais — benéfica
para os usuários — é um dos pontos que sempre atravanca as hidrovias. No caso
das hidrovias amazônicas, há quem tema perda de competitividade da ferrovia
Norte-Sul e do prolongamento da estrada de ferro da ALL até Rondonópolis (MT).
Por isso, a
eclusa de Tucurí, em Tocantins, quase não foi usada, mesmo após de ser
concluída com 20 anos de obra e custo de R$ 1 bilhão. O rio não está navegável
o ano todo pela necessidade de um derrocamento (espécie de dragagem), no Pedral
do Lourenço, que custa R$ 600 milhões.
— Os governos
sempre optaram por um modal, em vez de investir em vários, criar uma rede. Não
haverá competição: as hidrovias serão para produtos de baixo valor agregado,
como as commodities (produtos básicos como minérios e soja), as ferrovias serão
para bens de médio valor agregado e as rodovias, para cargas regionais,
urgentes e produtos refrigerados, por exemplo — diz Pavan.
O
especialista conta que foi procurado por grupos holandeses e noruegueses, além
de brasileiros, interessados no setor.
Wilen
Manteli, presidente da Associação Brasileira dos Terminais Portuários (ABTP),
vê retrocesso: no setor
— Estamos
andando para trás. Há 50 anos o Rio Grande do Sul tinha 1.200 km de hidrovias,
hoje são apenas 800 km, porque uma dragagem de um trecho de míseros 1.500
metros está atravancada há 12 anos pelo governo estadual. O Mississippi, por
exemplo, é gerido por agência mista e incentiva a criação de empresas e de
cargas. Assim, não rouba a carga de outros meios, a carga é nova.
O superintendente
de Navegação Interior da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq),
Adalberto Tokarski, é otimista. Diz que a iniciativa privada faz sua parte e o
transporte de soja tende a crescer:
— Em 2016, o
Rio Madeira pode levar 4,5 milhões de toneladas de soja, contra 3 milhões deste
ano. O Tapajós, a partir de Miritituba, e o Tocantins poderão chegar a 3
milhões e 6 milhões de toneladas, respectivamente.
No Tietê, o
avanço esperado é de 6 milhões de toneladas para 12 milhões. No total, a carga
destes quatro rios passará dos nove milhões de toneladas para 25,5 milhões, até
2016. Serão menos 450 mil caminhões com 37 toneladas de soja cada um.
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