sexta-feira, 1 de outubro de 2010

As mudanças na Marinha Mercante: os trabalhadores foram os mais afetados

Para inaugurar este Blog nada melhor do que falar nas mudanças ocorridas nos últimos 20 e poucos anos na Marinha Mercante em todo o mundo, tema que é do interesse de todos nós.


A Marinha Mercante mundial sofreu profundas mudanças a partir dos anos 70 e 80. No Brasil essas mudanças começaram a se fazer sentir com mais força no final da década de 80 e se aprofundaram durante os anos 90, com a assunção de Fernando Collor à Presidência da República, e suas mudanças econômicas com o objetivo de "modernizar" o país, e as medidas estabilizadoras da economia implementadas por Fernando Henrique Cardoso.


Se é verdade que isso nos possibilitou o acesso a tecnologias mais avançadas e a produtos antes difíceis, ou mesmo impossíveis de se achar, ainda proibidos a nós brasileiros, isso também criou uma série de problemas em nossa economia, seja por ter aberto um país totalmente despreparado à competição internacional altamente desenvolvida, seja pela pouca capacidade de adaptação imediata à nova situação, ou mesmo pela total falta de compreensão do que ocorria.


Fato é que os trabalhadores foram sempre os mais afetados. Setores inteiros de nossa economia foram dizimados, ceifando milhares de empregos; a terceirização foi imposta à força e de forma indiscriminada, aviltando salários e condições de trabalho de outros tantos; as novas tecnologias tornaram profissionais experientes e eficientes em estorvos ultrapassados e ineficientes, cuja substituição era imperativa para que as empresas pudessem ultrapassar o "momento difícil" por que passavam. Em muitas áreas essa situação persiste até hoje.


Nossa Marinha Mercante, como disse acima, não ficou fora desse processo e sofreu profundas mudanças devido ao mesmo. Em um primeiro momento companhias de navegação tradicionais desapareceram (Lloyd Brasileiro, Netumar etc.), ou encolheram e se restringiram a nossa costa (que permanece resguardada da competição internacional). Em seguida, as resistentes começaram a ser absorvidas pelos grandes "players" do setor, casos de Aliança, Frota Oceânica etc.


O desemprego era regra geral em nosso meio, nossos sindicatos chegaram quase a desaparecer, como as empresas que nos davam emprego. Muitos de nós se refugiaram nos navios estrangeiros de Bandeira de Conveniência para conseguir o sustento de suas famílias.


A situação hoje é completamente distinta da década de 80. Nossa navegação de longo curso está praticamente extinta, limitada a viagens de docagem ou esporádicas em épocas de pico de preço de frete internacional. Nossa navegação de cabotagem tem se desenvolvido relativamente bem, mas ainda sofre com a opção pelo transporte rodoviário adotada por nossos governos. O "off-shore" emprega uma quantidade grande de nossos companheiros e dificilmente passa na cabeça de um(a) marítimo(a) brasileiro(a) a possibilidade de fazer uma longada, ou se afastar por mais de 4 ou 5 meses de casa (quando a intenção da maioria é diminuir ainda mais o tempo de afastamento).


Não falemos de salários porque com isso ninguém jamais está satisfeito.


Nossas condições, hoje, são, ao menos, dignas, e possibilitam a manutenção de nossos empregos e o sustento de nossas famílias. Mas os problemas que nos afligiram no final dos anos 80 e pelos 90 estão longe de estarem extintos ou de não serem uma ameaça. A implementação da globalização na Marinha Mercante é conhecida com o nome de "Bandeira de Conveniência", e ela estará presente em muitos de nossos "posts".


Sabemos que entre nossos companheiros muitos se encantam com histórias ouvidas a bordo, sobre casos que ocorrem em navios estrangeiros. Teremos a oportunidade de discutir vários desses aspectos, mas também vamos buscar curiosidades sobre o setor em si, e sobre outros aspectos da vida que interessam a todos de forma geral.

2 comentários:

  1. Beleza, Airton.
    Parabéns pela iniciativa, finalmente teremos um fórum para discutir e analisar a problemática desta chaga chamada Bandeira de Conveniência. Pode contar com meu apoio, como marítimo e como Inspetor da ITF no Porto de Santos, com certeza terei muito a contribuir. É preciso elucidar e denunciar às táticas desleais praticadas por esse fenômeno que assola a indústria mercante mundial, e que tanto tem afetado nosso mercado de trabalho.
    Sucesso e um Forte Abraço
    Renialdo Salustiano.

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  2. Ótimo texto, Airton.
    Sinceramente temo pelos próximos desdobramentos, tamanha é a pressão dos Armadores para transformar nosso pavilhão numa BDC.
    Forte abraço.

    Rodrigo Cintra
    Portal Marítimo

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