A reportagem do Valor Econômico é
típica de quem está vendo um problema sob uma ótica distorcida. Por parte de
exportadores, claramente há pedidos para que o governo brasileiro imponha
restrições de preços a empresas estrangeiras que atuam no Brasil, no comércio
internacional. Por outro lado o governo responde baseado em uma lenda, que se
chama livre concorrência. Por último, parte dos atores do setor, reclama que a
nova Lei dos Portos não teve as repercussões que se esperavam. Vamos analisar
essas posições e dar nossa sugestão.
Primeiro a questão de uma
intervenção do governo no preço de fretes internacionais de mercadorias
transportadas do e para o Brasil. Isso é algo muito difícil para qualquer
governo, com as ferramentas que nosso governo tem. Na verdade quase impossível,
pois não temos ferramentas adequadas para intervir nesse mercado.
Outra coisa é a réplica do
governo. Livre Mercado é lenda. Empresas sempre buscam uma maneira de evitar a
concorrência, e isso se torna mais fácil quando os governos têm poucos, ou
nenhum mecanismo para intervir nos diversos setores que compõem sua economia.
No Brasil temos poucas formas de intervenção.
A Lei dos Portos. Sim ela tem
condições de, em médio prazo (5 ou 6 anos), começar a diminuir custos no setor
portuário. O problema é que diminuição de custos não significa necessariamente
diminuição de preços. Como já dissemos aqui no Blog dos Mercantes, empresas
buscam primeiramente maximizar seus lucros. Assim, qualquer diminuição de
custos, tende a ser incorporada aos lucros, como forma de aumenta-los, e não
aos preços, para abaixá-los. A segunda
hipótese só aparece quando é necessária, seja por concorrência (que como já
dissemos, é evitada pelas empresas), seja por pressão de governos (que também
como já vimos, temos poucas formas de intervenção).
Então precisamos mudar três
posições para começarmos a acertar esse mercado de fretes ligados à Marinha
Mercante. A primeira coisa é pararmos de acreditar na falácia do Livre Mercado,
e de que diminuição de custos leva a diminuição de preços. O discurso até pode
continuar esse, mas precisamos criar e usar recursos para intervir nos setores
chaves de nossa economia, de forma a levá-los a apresentar preços e eficiências
adequados às nossas necessidades.
Para isso é necessário não só
acompanhar os preços, mas atuar ativamente no mercado, com a manutenção de uma
agência reguladora forte e respeitada. O CADE deveria ser melhor utilizado,
tendo como base o direito do consumidor brasileiro, e a economia brasileira,
estando em segundo plano interesses de empresas, se estrangeiras ficam ainda
mais atrás, principalmente se não investem diretamente no país (caso das
empresas de navegação estrangeiras).
Outra medida necessária é manter
uma Marinha Mercante nacional de Longo Curso, com a finalidade de poder
intervir no preço dos fretes. Como já mostramos em outras postagens, a
manutenção de uma Marinha Mercante tem outras vantagens e abre o leque de
outras possibilidades também, não apenas no preço direto do frete, mas também
no custo do produto brasileiro no exterior.
A partir disso temos que fazer
contas. O que é mais barato, gastar mais de USD 10 bi ao ano em fretes, pagos a
empresas estrangeiras, fora os custos aumentados em nossos produtos pelo preço
abusivo de frete, e rotas mais longas às quais nos obrigam para determinados
mercados, ou a manutenção de uma frota mercante própria?
Ah, ela terá que ser subsidiada.
Provavelmente. Acontece que temos subsidiado muita coisa, que no final das
contas caem em mãos de empresas estrangeiras. Porque não subsidiar a nós
mesmos?
Valor Econômico – Reportagem –
22/05/2014
Reforma portuária não reduz custos
Por Fernanda Pires | Para o
Valor, de São Paulo
Usuários finais dos portos, os
chamados donos de cargas, dizem que a reforma portuária - prestes a completar
um ano - não reduziu os preços que eles pagam para operar. Segundo Osvaldo
Agripino, fundador e consultor jurídico da Associação dos Usuários dos Portos
de Santa Catarina (Usuport), a maior oferta de terminais irá beneficiar os
armadores, que são os clientes diretos dos portos. Mas a Lei dos Portos não
garantiu mecanismos para a companhia de navegação repassar ao exportador a
redução dos custos de operar nos portos. Em porto, o dono da carga contrata o
armador que, por sua vez, escolhe o terminal onde atracará o navio. "A
reforma não alcançou o armador. Não adianta fazer mais terminais se os agentes
logísticos não são regulados."
Agripino criticou o que considera falta de
atuação da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) sobre a
atividade dos armadores transnacionais, que transportam 98% do comércio
exterior brasileiro. "Uma vez aqui, eles delegam a atividade a um agente
marítimo. Na hora em que você tem um problema não consegue pegar o armador. A
Antaq não tem controle nenhum, não sabe quais são os navios, não dá as escalas,
não tem outorga de autorização, não sabe o que eles cobram dos usuários",
disse. As manifestações foram feitas em evento de infraestrutura realizado pela
Fiesp.
Diretor da Antaq, Fernando Fonseca disse que a
agência não tem a prerrogativa de emitir outorga para esses operadores
realizarem a atividade no país, ao contrário do que acontece com empresas de
bandeira brasileira. "O que podemos fazer é um ato normativo para
regulamentar, regular e fiscalizar a atuação dessas empresas. A gente pretende
baixar um ato normativo", disse, sem dar data.
A ideia é monitorar fretes, mas não tabelar
preços. Assim como acompanhar as cobranças de demurrage (sobrestadia cobrada
pelo armador do usuário por atraso na entrega do contêiner) e o desempenho e a
qualidade do serviço dessas empresas.
Só de itens extras cobrados são mais de 20,
além do frete marítimo propriamente, afirmou Agripino. De acordo com ele, 70%
dos armadores de longo curso que operam em águas brasileiras usam bandeira de
conveniência registrada em outros países.
Sobre a afirmação de que a Lei
dos Portos não garante a redução de custos aos donos das cargas, o assessor
especial da Secretaria de Portos (SEP), José Newton Barbosa, discordou. "O
dono da carga contrata o armador por meio de um agente. Esse agente vai ter de
reduzir o preço em função da competitividade", afirmou.
Os terminais portuários também criticaram
alguns aspectos da nova lei. As instalações criadas no bojo da antiga lei, de
1993, irão sugerir ao governo mecanismos para equilibrar a convivência com os
novos terminais que serão arrendados nos portos públicos. A reforma mudou as
regras para a iniciativa privada entrar na operação portuária: eliminou a
exigência de o empreendedor pagar outorga para vencer a licitação. O ágio do
leilão vem sendo precificado nos serviços cobrados pelos terminais ao longo do
arrendamento.
Já o novo critério para arrematar as áreas
será a garantia de menor tarifa a ser cobrada pelo serviço ou a maior
movimentação de cargas, o que criará dois modelos econômicos diferentes no
mesmo ambiente concorrencial.
"Estamos buscando formas de equilibrar as
duas estruturas", disse o delegado da Associação Brasileira de Terminais
Portuários (BTP) e presidente da Brasil Terminal Portuário (BTP), no porto de
Santos, Henry Robinson. O executivo não detalhou quais serão as sugestões.
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