quarta-feira, 1 de maio de 2019

Se aplica a qualquer um

Vejam que interessantíssimo texto de Mafalda Anjos. O link para o artigo está no título abaixo, mas esse eu coloquei completo. Primeiro porque não é longo, e segundo porque vale muito a pena ser lido.

Com o texto não quero dizer de modo algum que não se deva trabalhar, e nem que se deva trabalhar pouco, apenas que há um limite para corpo e cérebro produzirem, a além desse limite a produtividade cai e os erros acontecem. Muitas vezes isso acaba por impactar negativamente as empresas, e claro, os trabalhadores.

Como se pode ver também, o texto é português, mas no Brasil esse problema pode ser ainda mais sério.

Por último ainda reduz vagas de emprego, atrapalha a distribuição de riqueza, e o dinamismo da economia.

Pense nisso.

Feliz dia do trabalho!


O culto do excesso de trabalho

DR

Sair antes das 18h é malvisto, aos olhos dos colegas ou dos chefes, mesmo que parte do tempo seja passado em “conversetas” e cafés

Este mês, estive em Copenhaga para um fim de semana prolongado. O que mais me impressionou, no modo de vida da cidade, foi o facto de ali se trabalhar tão pouco. Ou melhor, muito menos horas do que por cá. As pessoas saem dos empregos às 16h – até as lojas têm horários apertados (funcionam normalmente das 10h às 16h, e apenas à sexta até mais tarde) – e vão, pasme-se, alegremente para as suas vidas. E ainda têm cinco semanas de férias pagas. Extraordinariamente, a Dinamarca está no topo dos rankings de produtividade, ao mesmo tempo que cultiva o hygge, a receita para ser feliz que já vendeu milhões de livros, de forma exemplar: o país bate, há anos, todos os índices de felicidade.
Sair às 16h é algo inimaginável para a maior parte dos portugueses que eu conheço. Sair antes das 18h é malvisto, aos olhos dos colegas ou dos chefes, mesmo que parte do tempo seja passado em “conversetas” e cafés. E, ao contrário do que acontecia há 30 anos, quanto mais bem pagos são os trabalhadores, maior é a probabilidade deste horário ser uma miragem. Falava este fim de semana com uma bem-sucedida amiga advogada que me dizia que trabalhava sempre, todos os dias, 12 horas. Dizia-o sem qualquer queixume, é simplesmente assim que é suposto ser num grande escritório de advogados. A mesma coisa na consultoria ou alta finança, e numa série de outras áreas de atividade em que o índice de sucesso está indexado ao tempo passado nos escritórios. Com uma agravante: a tecnologia que existe hoje e que nos liga 24 horas, sete dias por semana, e nos obriga a estar sempre em modo on. Em 2002, menos de 10 por cento dos funcionários diziam ver o email fora do emprego, hoje mais de 50% fazem-no em casa, muitas vezes antes de se levantarem da cama. Ou temos uma enorme autodisciplina ou podemos estar, das 7h da manhã às 24h, sempre a tratar de trabalho, sem fronteiras nem limites.
Não é preciso grandes estudos – embora eles existam aos magotes – para se perceber que este tipo de estratégia dá, a médio prazo, inevitavelmente maus resultados para a saúde dos trabalhadores e para as empresas, e, em última análise, para as economias. Está provado que jornadas longas diminuem a qualidade e a produtividade: nos trabalhadores industriais dão mais azo a erros e a problemas de segurança, nos trabalhadores qualificados há uma redução da eficiência graças a níveis cognitivos reduzidos. Ainda que o trabalho possa ser absolutamente prazeroso e recompensador, os efeitos fazem-se sentir à mesma na saúde: depressão, ansiedade, hipertensão e problemas do sistema imunitário e do coração.
Lembro-me de Elon Musk e do seu culto do “workaholism”: o chefe da Tesla orgulha-se de trabalhar 120 horas semanais e chega a dormir na empresa, privilegiando os funcionários que seguem o seu exemplo. O resultado está à vista: na entrevista que deu ao New York Times, em agosto, mal conseguia articular-se e confessou sofrer de exaustão e de problemas de sono. Todos, menos provavelmente o suposto génio, viram um burnout a acontecer.
Como se sai daqui, eis a questão. Uma mudança de cultura empresarial não se faz da noite para o dia, e pode ter custos laborais imediatos com retorno apenas mais adiante. Mas é, para bem de todos, urgente repensar este culto do excesso de trabalho nas empresas portuguesas que começa, muitas vezes, nos próprios trabalhadores. Até porque as novas gerações são cada vez menos adeptas destas práticas: querem, acima de tudo, um emprego e uma vida com significado. Mas só há significado se existir, antes de mais, uma vida.
Eu, workaholic me confesso, acho que vou colar este texto na parede: pode ser que assim me lembre de pensar duas vezes antes de verificar o email na cama.
(Editorial da VISÃO 1338, de 25 de outubro de 201

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