domingo, 14 de junho de 2020

Livre iniciativa é lenda na economia de ponta

O mundo capitalista é um mundo fundamentalmente dependente dos Estados. Por sinal, toda sociedade humana sempre foi altamente dependente dos Estados pela História afora. Mesmo na Idade Média, quando teoricamente os Estados teriam sido dizimados, o que ocorria era a redução do poder estatal a áreas menores, e concentradas nas mãos de uma pessoa, ou de castas. Isso quando se entende Estado numa amplitude mais ampla, que é constituído por uma sociedade humana, não apenas por uma área geográfica.

O Liberalismo nunca prosperou no mundo, em nenhum momento da História, ainda que seus defensores busquem explicações mirabolantes, sempre omitindo fatos, ou esquecendo de colocar alguns acontecimentos que colaboraram (e colaboram) no desenvolvimento do mundo, sempre com fundamental participação estatal.

Assim é que durante a chamada Acumulação Primitiva de Capital, os Estados europeus promoviam pilhagens, corsários, invasões de outras culturas, etc. Durante a implantação da primeira revolução industrial os Estados europeus souberam impor tratados entre si, novas situações às suas populações, que viabilizaram mão de obra barata e farta às suas incipientes indústrias, e mercado consumidor para seus excedentes. Em fases mais avançadas foram à guerra para garantir fornecimento de matérias primas e mercados consumidores.

Hoje isso se faz através da ciência e tecnologia. Isso é caro, e nenhuma empresa está disposta a arcar com os custos dessas pesquisas.

Mas e aquela inovadora empresa de carros? A pesquisa dela não funciona com investimentos próprios. Ela se utiliza de acordos comerciais, que liberam tecnologias de última geração, e em fase de pesquisa, mas que na ponta são financiadas pelo governo americano, a pretexto de corrida armamentista ou aeroespacial.

O Brasil e seu liberalismo acrítico acha que isso vai cair do céu.



O governo brasileiro liquidou nossa empresa de semicondutores, os governos de China, Coreia e Taiwan seguem fortalecendo as deles


*escrito com um especialista que preferiu não ter seu nome divulgado
Segundo o Secretário Especial de Desestatização, Desinvestimento e Mercados do Ministério da Economia, Salim Mattar, a empresa deu prejuízo de R$ 12 milhões em 2019 e, desde que foi criada em 2008, o governo teria investido R$ 907 milhões, sem retorno. O setor de semicondutores é considerado estratégico em todo o mundo. Chips formam a base de praticamente todas as tecnologias cruciais do futuro, como inteligência artificial, robótica, carros autônomos e internet das coisas. Está no centro da guerra tecnológica entre as duas maiores potências do mundo, China e Estados Unidos. Para atrasar e até bloquear o avanço da Huawei na tecnologia 5G, os EUA restringiram o acesso da empresa a insumos que contenham tecnologia americana. O maior gargalo? Semicondutores. A TSMC, empresa taiwanesa que se tornou referência na fabricação de chips, é cobiçada pelos dois países. Na China, fala-se inclusive em invadir Taiwan para assegurar o fornecimento regular dos chips (https://chinatalk.substack.com/p/huawei-banned-so-lets-invade-taiwan). Trump, por outro lado, aproveitando-se da rivalidade entre Taiwan e China, pressionou a TSMC para que ela construísse uma planta de chips no Arizona (https://t.co/U4xbM2xbiP?amp=1).
O problema é que produzir semicondutores é muito difícil. A curva de aprendizado é longa. O setor é um dos mais intensivos em pesquisa e desenvolvimento e o montante de investimento requerido, sem retorno garantido, é muito elevado. Nesse sentido, as pioneiras levam muita vantagem sobre as retardatárias. Pioneiras que, como Intel, Samsung e TSMC, beneficiaram-se enormemente do Estado, seja por meio de compras governamentais (especialmente a Intel, em decorrência da demanda dos complexos aeroespacial e militar americanos), seja pela concessão de empréstimos subsidiados (com destaque para a Samsung), seja pelo investimento público em pesquisa e desenvolvimento (TSMC é um spin-off do Industrial Technology Research Institute de Taiwan)
O quadro abaixo mostra como é difícil para empresas retardatárias reduzirem a distância em relação às pioneiras. Neste setor, quanto menor for o tamanho do nódulo, mais avançado ele é tecnologicamente. As duas últimas são empresas chinesas, estatais, mais antigas do que a brasileira CEITEC e que receberam investimentos muito maiores, mas que mesmo assim continuam atrasadas tecnologicamente em relação às líderes do setor. Pelo menos desde 2011, com a Circular Nº 4 do Conselho de Estado (Several Policies for Further Encouraging the Development of the Software Industry and Integrated Circuit Industry), o setor é considerado estratégico para o futuro do país. Em 2014 foi criado o China Integrated Circuit Industry Investment Fund Co., Ltd, com recursos da ordem de US$ 23 bilhões. O Plano Made in China 2025 estabeleceu como objetivo atingir 40% de autossuficiência em chips até 2020 e 70% até 2025. A real magnitude do apoio governamental chinês ao setor de semicondutores é difícil de mensurar, pois envolve uma série de instrumentos e não se caracteriza por ser transparente. Mesmo assim, a OCDE calculou estimativas para 21 empresas.  

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