quarta-feira, 27 de janeiro de 2021

A polêmica da Vacina da Pfizer

O Ministério da Saúde soltou a nota oficial abaixo. Nela há a confirmação de que houve contato entre o Governo Brasileiro e a farmacêutica Pfizer, no sentido de fornecimento de doses da vacina contra a Covid, que poderia ser desenvolvida pela indústria farmacêutica, e que foi recusado pelo Governo Brasileiro.

Não temos informações suficientes para afirmar que todas as informações abaixo são verdadeiras, ou que são falsas. Mas temos informações paralelas que nos levam a afirmar que, mesmo que todas as situações abaixo sejam corretas, ainda assim houve erro e displicência do Governo Brasileiro nas tratativas com o laboratório. Vamos a elas.

1- Propostas, ainda mais em nível governamental, são negociáveis. Então cabia ao Governo Brasileiro negociar com o laboratório sobre as cláusulas que se considerassem abusivas ou inapropriadas;

2- A afirmação das poucas doses, e do efeito de frustração que causaria na população não se sustentam, porque um país tão populoso como o Brasil não pode se fiar em apenas um fornecedor. Isso se comprova com as aquisições da Coronavac, Astrazeneca, e da Sputnik V (feita pelo consórcio do NE). A composição de todas elas atenderiam a população brasileira, e a vacina da Pfizer seria mais uma.

3- Jurisdição das disputas. Ora, as cláusulas tentadas pela farmacêutica estão de acordo com o que reza a legislação americana. Cabia ao Brasil buscar outra jurisdição para resolver disputas. Isso foi tentado?

4- Diferente do que afirma a nota, o Presidente da República, ele mesmo, desdenhou da vacina em questão, afirmou que não tomaria, e ainda por cima levantou suspeitas infundadas sobre a mesma. Se é verdade que a farmacêutica pode ter tentado se eximir de responsabilidades por efeitos colaterais, é ainda mais verdade que foram levantadas suspeitas infundadas sobre a eficácia da droga, e possíveis efeitos colaterais. Talvez fosse engraçado numa mesa de boteco, mas vindo do Presidente da República é, no mínimo, irresponsável.

5- Falta de penalização no atraso não é desculpa para a não assinatura. Porque se há atraso, não há pagamento.

6- O Brasil abrir mão da soberania de seus ativos no exterior faz sentido, mas como todo o resto, é negociável.

7- O Governo Brasileiro diz esperar um posicionamento diferente do laboratório. Isso foi tentado? Foi pedido? Foram feitas contrapropostas?

8 - A questão da logística é algo a ser preparado. Nenhum, ou quase nenhum país do mundo está preparado para lidar com tantas doses de uma vacina que exige tantos cuidados, mas vários buscaram soluções para isso. Diferente do que afirma a nota, ou o próprio Presidente da República, isso não é apenas responsabilidade da farmacêutica, mas também do Governo Brasileiro, já que há interesse mútuo.

9- Por fim a desculpa esfarrapada de não haver uma minuta do contrato. Mas como haver uma minuta para ser estudada e proposta, se tantos pontos fundamentais de um possível acordo estão totalmente a descoberto, e longe de qualquer definição?


NOTA

Publicado em 23/01/2021 18h51 Atualizado em 23/01/2021 21h15

O Governo Federal/Ministério da Saúde informa que recebeu, sim, a carta do CEO da Pfizer, assim como reuniu-se várias vezes com os seus representantes. Porém, apesar de todo o poder midiático promovido pelo laboratório, as doses iniciais oferecidas ao Brasil seriam mais uma conquista de marketing, branding e growth para a produtora de vacina, como já vem acontecendo em outros países. Já para o Brasil, causaria frustração em todos os brasileiros, pois teríamos, com poucas doses, que escolher, num país continental com mais de 212 milhões de habitantes, quem seriam os eleitos a receberem a vacina.

Entretanto, não somente a frustração que a empresa Pfizer causaria aos brasileiros, as cláusulas leoninas e abusivas que foram estabelecidas pelo laboratório criam uma barreira de negociação e compra. Como exemplo, citamos cinco trechos das cláusulas do pré-contrato, que já foram amplamente divulgadas pela imprensa:

1) Que o Brasil renuncie à soberania de seus ativos nos exterior em benefício da Pfizer como garantia de pagamento, bem como constitua um fundo garantidor com valores depositados em uma conta no exterior;

2) O afastamento da jurisdição e das leis brasileiras com a instituição de convenção de arbitragem sob a égide das leis de Nova York, nos Estados Unidos;

3) Que o primeiro e segundo lotes de vacinas seja de 500 mil doses e o terceiro de um milhão, totalizando 2 milhões no primeiro trimestre, com possibilidade de atraso na entrega (número considerado insuficiente pelo Brasil);

4) que havendo atraso na entrega, não haja penalização; e

5) Que seja assinado um termo de responsabilidade por eventuais efeitos colaterais da vacina, isentando a Pfizer de qualquer responsabilidade civil por efeitos colaterais graves decorrentes do uso da vacina, indefinidamente.

Após o Governo Federal ter adquirido toda a produção inicial da vacina do Butantan (da Sinovac) - 46 milhões de doses -, com opção de compra de mais 54 milhões, ter recebido da Índia 2 milhões de doses da Astrazeneca / Oxford, com opção de importação de mais doses, além da produção dessa vacina pela Fiocruz de 100,4 milhões de doses no primeiro semestre e mais 110 milhões de doses no segundo semestre, considerando também a possibilidade de aquisição de 42,5 milhões de doses pelo mecanismo Covax Facility, representantes da Pfizer tentam desconstruir um trabalho de imunização que já está acontecendo em todo o País. Criando situações constrangedoras para o Governo Brasileiro, que não aceitarão imposições de mercado - o que também não será aceito pelos brasileiros.

Em nenhum momento, o Governo Federal, por meio do Ministério da Saúde fechou as portas para a Pfizer. Em todas as tratativas, aguardamos um posicionamento diferente do laboratório, que contemple uma entrega viável e satisfatória, atendendo as estratégias do Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19, uma ação de valores mercadológicos e aplicação jurídica justa que atenda ambas as partes.

Além da Pfizer,  com a qual o Governo Brasileiro continua em negociação, outros laboratórios já estão em fase avançada de negociações com o Brasil, dentro dos princípios e normas estabelecidas.

Merece destaque o fato de que, além dos aspectos já citados, é a única vacina que precisa ser armazenada e transportada entre -70°C e -80°C, prevendo um intervalo de três semanas entre primeira e segunda doses.

Além disso, o laboratório não disponibiliza o diluente para cada dose - que ficaria a cargo do comprador.

Embora o laboratório tenha criado uma solução para a conservação das doses durante o transporte (uma caixa de isopor revestida por um papelão não impermeável, que nos foi apresentada ao final de novembro, naquela oportunidade com a informação de conservação por 15 dias) e tenha oferecido fazer a logística desde a chegada dos EUA até o ponto designado pelo Ministério da Saúde, junto ao CONASS e CONASEMS, a Pfizer não se responsabilizaria pela substituição do refil de gelo seco - que deverá ser reposto a cada cinco dias (informaram que a conservação seria de 30 dias no mês de dezembro). Nos contatos de agosto, setembro e outubro, não havia ainda nos sido apresentada a alternativa da caixa térmica.

Além disso, a Pfizer ainda não apresentou sequer a minuta do seu contrato - conforme solicitado em oportunidades anteriores e, em particular na reunião ocorrida na manhã de 19 de janeiro – e tampouco tem uma data de previsão de protocolo da solicitação de autorização para uso emergencial ou mesmo o registro junto à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Ministério da Saúde

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