Eu concordo apenas em parte com as posições assumidas pelo Estadão em seu editorial de 13 de fevereiro. Sim, porque é verdade que o PT colocou pessoas intimamente ligadas ao partido e seus espaços de poder em posições chave do Estado, é verdade que houve um inchaço em algumas áreas de forma irresponsável e desnecessária, enquanto áreas importantíssimas foram relegadas ao ostracismo ou irresponsavelmente privatizadas, numa sistemática de importação de soluções estrangeiras mal lidas e ainda pior implementadas.
Mas eu gostaria que o autor do texto me mostrasse em qual país um partido político, ou grupo organizado de interesses, mobilizou recursos financeiros, tempo, militantes, outros recursos vários para chegar ao poder, e depois não fazer nada para atender aos grupos de poder que compõem esse partido ou para atender aos interesses dos outros?
Sim, no mundo inteiro uma eleição ocorre para que haja uma opção por determinada linha político-econômico-social, e essa opção se expressa na ocupação dos espaços de poder que o governo oferece. E é por isso que o Estado não é restrito apenas ao Executivo, e é necessária toda uma estrutura de freios e contrapesos para impedir que a assunção de um movimento político ao governo se transforme em ditadura.
Da mesma forma, quando o autor se refere aos princípios da administração pública - legalidade, impessoalidade, moralidade, impessoalidade e eficiência - ele distorce o sentido a que os termos se referem na Constituição, e leva o leitor a um engano.
Mas se é verdade que a moralidade, a legalidade e a eficiência foram seriamente escanteadas em vários momentos da administração petista, e isso fica claro em escândalos como a Lava-jato, o mensalão, ou o caso do caseiro que derrubou Palocci, também fica nítida a distorção que o editorial do Estadão aplica, já que eles centram a maior crítica no sentido da impessoalidade.
E aqui temos que entender o que significa impessoalidade para a Constituíção, e pouco tem a ver com a organização dos grupos, ocupação de cargos, e pessoas sendo beneficiadas. Ora, as relações políticas e de governo são humanas, e portanto pessoas são beneficiadas ou não por elas. E o que nossa Constituição diz é que a impessoalidade obriga ao governo de ocasião a prestar a mesma atenção a todos os entes da Federação, sem privilégios que tenham a ver com região, apoios políticos, ou interesses particulares dos membros do governo. E se Jair Bolsonaro foi pego várias vezes utilizando esses critérios personalistas para entregar recursos a estados e municípios (não dê recursos ou cria obstáculos ao Nordeste, ou a estados e municípios que lhe são oposição), tal fato não foi observado nos governos petistas, ainda que os bancos e o setor rentista tenha sido beneficiado por políticas públicas em detrimento de responsabilidades sociais do governo, como Saúde, Educação e Segurança. Mas esse é um problema que perpassa todos os governos desde (ao menos desde Collor), e que é justamente minha última crítica ao editorial do Estadão.
Sim, porque o editorial do jornal paulista critica o inchaço do Estado, e que isso impede que o mesmo ofereça os serviços que deveria, com a qualidade que deveria. Ora, o grande inchaço que existe no Estado brasileiro é a dívida pública, que consome cerca de 50% do orçamento do país entre rolagem e juros, que foi criadas sem motivo justificado, e que impede o país de crescer, já que é alimentada por juros e outros mecanismos abusivos, que atendem apenas a uma ínfima minoria da população (algo em torno de 1%) em detrimento da imensa maioria.
Acontece que é justamente isso que o jornal paulista apoia - essa política macroeconômica concentradora e destruidora - e busca desesperadamente uma opção que se submeta a manter essa excrescência, mas que seja palatável. De preferência esse "ungido" também deve "entender" que políticas que minimizem o sofrimento dos mais pobres são populistas, e todos os recursos do Estado devem ser drenados para a política de Robin Hood às avessas praticada pelo Estado brasileiro. O problema é que o Estadão não chega nem perto do verdadeiro problema, e tenta jogar a culpa do inchaço do Estado brasileiro num suposto exagero de funcionários público e de empresas, quando na verdade tudo isso nos falta.
Lula, Bolsonaro, nem nenhum outro governante tentaram seriamente romper com essa estrutura, que nos condena ao atraso, e a cada vez mais nos distanciarmos dos ciclos civilizatórios do mundo. Só que para eles não basta atender esses interesses, também precisa ter um ar de nobreza para sustentar uma posição que nossa elite não tem, mas que preza.
Minhas críticas ao PT são muitas, mas nenhuma é distorcida como as do editorial do Estadão, porque esses pecados o PT não cometeu. Durante seus governos seguiram faltando escolas e faculdades (em quantidade e qualidade), hospitais, saneamento, segurança pública piorou, mas o Estado arrecadou e gastou como nunca. Para onde foi esse dinheiro, se não para esse 1% que não precisava?
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