Na última semana o Presidente americano, Joe Biden, promoveu uma espécie de encontro virtual com outras lideranças do mundo ocidental, Ele chamou esse encontro de Cimeira pela Democracia. Bem, cimeira certamente foi, mas pela democracia há enormes divergências, já que é nítido, que o conceito de democracia americano sempre foi muito maleável, a depender dos interesses de momento do país. Além disso, desde a segunda metade do finado e desastrado governo Trump, os EUA buscam desesperadamente retomarem a liderança ampla e inconteste que exerciam sobre o mundo ocidental. Não que essa liderança tenha desaparecido, mas é inegável que ela foi muito fragilizada após o desastre geopolítico de Trump, a fragilização das instituições americanas e de sua economia, da debilitação de sua liderança tecnológica após a adoção de políticas neoliberais, e por fim de uma deterioração de condições internas de alguns aliados, causadas principalmente pelas desastrosas políticas intervencionistas ianques em países próximos a eles.
Mas todo bloco e liderança precisam de opositores, porque do contrário eles não fazem muito sentido. É a velha história do bem contra o mal. E quem melhor do que a Rússia e a China para serem o grande vilão do bloco ocidental? Os países que juntos, hoje, têm tecnologia de ponta em praticamente todas as áreas, que estão na frente do bloco ocidental em tecnologia em várias áreas, a China que hoje é com certeza o 2º maior PIB mundial, e segundo alguns critérios, já o 1º. Da mesma forma a Rússia, hoje, tem armas mais avançadas que os ocidentais. Os dois juntos são considerados enorme ameaça ao modo de vida desenvolvido pelas revoluções burguesas dos Séc. XVII e XVIII.
Aí entra a Ucrânia, um país relativamente obscuro, comumente confundido com a própria Rússia, já que compartilha boa parte de sua história com ela, que tem certa importância, principalmente na produção de grãos e com uma indústria relativamente sofisticada, um exército importante em tamanho e poder de fogo, mas que apesar disso não é considerado entre as principais potências europeias.
Só que a Ucrânia tem uma série de rusgas mal resolvidas com a Rússia, que foram acentuadas após a dissolução da URSS, e com o crescimento da extrema-direita no país, algo que ocorreu com nítido incentivo norte-americano, e de alguns outros países europeus.
Isso criou sérios problemas na região de fronteira entre os dois países. Nessa região existem muitos pró-russos, que têm sido ameaçados e até mortos, e segundo os russos há chance de expansão da violência na região, e até mesmo de um genocídio. Isso fez com que o Kremlin deslocasse tropas para a fronteira, e a tensão entre os dois países, que como vimos já não é boa, aumentasse. Além disso tudo ainda temos a possibilidade de os ucranianos aderirem à OTAN, o que colocaria um oponente bastante desagradável já na fronteira russa.
A reportagem do Diário de Notícias relembra semelhanças com a crise dos mísseis de Cuba de 1962, quando a solução foi obtida com ambas as partes cedendo às demandas do outro lado. Mas podemos também lembrar do Príncipe Ferdinando em Sarajevo. Aí fica a questão: eles matarão o príncipe, ou terão o mínimo de bom-senso e resolverão suas desavenças de forma civilizada e racional?
Enquanto isso o povo sofre. Porque no fundo nenhum deles está preocupado com democracia, ou com o povo. Pelo menos não o povo que está no cerne dessa disputa.
Guerra de palavras. A "chama da liberdade" de Biden vs. o "genocídio" na Ucrânia de Putin
O presidente dos EUA encerrou ontem a Cimeira pela Democracia, enquanto o homólogo russo criticou a "russofobia" em Donbass. Moscovo quer que a NATO retire o convite a Kiev para uma eventual adesão à Aliança Atlântica.
O presidente norte-americano, Joe Biden, defendeu ontem que "as autocracias nunca podem extinguir a chama da liberdade" no fecho da sua Cimeira pela Democracia, criticada por aqueles que foram deixados de fora da lista de convidados. Biden não mencionou nos seus comentários nem China nem Rússia - países onde os media oficiais têm apelidado de "hipócrita" esta iniciativa - mas a mensagem da cimeira (que espera possa ser presencial no próximo ano) foi para eles.
"O futuro pertence àqueles que abraçam a dignidade humana, não àqueles que a atropelam, àqueles que libertam o potencial do seu povo, não aos que o sufocam e àqueles que dão ao seu povo a capacidade de respirar livremente, não os que procuram sufocar o seu povo com uma mão de ferro", defendeu o presidente norte-americano, repetindo as palavras que já tinha proferido na Assembleia Geral das Nações Unidas. "O mundo democrático está em toda a parte. As autocracias nunca podem extinguir a chama da liberdade que arde no coração das pessoas à volta do mundo, que não conhece fronteiras, que fala todas as línguas", acrescentou no encerramento.
Mas enquanto Biden falava sobre democracia, a Rússia exigia que a NATO retire a abertura que existe desde 2008 para que a Ucrânia se possa juntar à Aliança Atlântica. Algo que o secretário-geral Jens Stoltenberg rejeitou que possa acontecer. "A relação da NATO com a Ucrânia vai ser decidida pelos 30 aliados da NATO e pela Ucrânia. Mais ninguém", disse Stoltenberg. "Não podemos aceitar que a Rússia esteja a tentar restabelecer um sistema onde as grandes potências como a Rússia têm esferas de influência, onde podem controlar ou decidir o que outros membros podem fazer", acrescentou.
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