Vamos à análise do texto de Nildo Ouriques, Economista e Prof. Universitário. É um texto relativamente longo, e sugiro a leitura para que tenham melhor entendimento do que critico. E vamos ao que interessa.
Nildo analisa como o resultado eleitoral de Ciro como se as eleições de 2018 e 2022 tivessem sido iguais, e elas foram muito distintas. Enquanto em 2018 tínhamos um Lula preso, uma Justiça que o condenava dia sim outro também, e uma imprensa malhando o PT mais do que se malha o judas, em 2022 tínhamos um Lula trôpego, uma Justiça anulando as próprias decisões, e ainda amplamente amparado por toda a máquina propagandística que se pode imaginar da imprensa e de quase toda a política nacional. Bolsonaro vinha com o Governo na mão, e não teve nenhuma vergonha em usar a máquina com claros motivos eleitorais. Além disso ambos se juntaram em atacar Ciro, que era o único que quebrava em algum tom com o atual sistema vigente.
Sim, o debate nacional é raso, e Ciro amarga o isolamento político. O próprio Ciro disse que ele não representa mais uma corrente de pensamento. Na sequência, sim, Ciro se coloca como um franco atirador na política, mas isso ele sempre foi, apenas indica que não terá mais nenhuma amarra partidária.
Sobre regressão programática ele não poderia estar mais errado. Em nenhum lugar do mundo se aplicam as soluções do trabalhismo clássico, simplesmente porque elas não têm lugar no mundo moderno em uma democracia burguesa, e é isso que o Brasil é. Na verdade Ciro tentou resgatar algo de trabalhismo, revisto e atualizado, em um partido que vinha a reboque do petismo, e que em 2022 fez questão de retomar essa posição (vide a votação na Câmara sobre o teto de gastos do PT).
A ambiguidade de Nildo aparece aqui, já que ele coloca um monte de culpas em Ciro, e depois diz que ele fez o que podia. Ora, só maluco acha que Ciro venceria em 2022 com tudo contra ele. Não foi o caso de Bolsonaro, que teve muitos apoios, inclusive ações efetivas, em prol de sua candidatura. Ciro não teve nenhum em nenhum dos pleitos. Os 13% de 2018, e os 3% de 2022 foram conseguidos em condições adversas, e depois ainda mais adversas.
Depois ele deturpa a posição de Ciro no impeachment. Ciro jamais permaneceu fiel a Dilma ou ao PT, mas ao processo democrático e legal. Nunca houve crime de responsabilidade, então nunca houve motivo jurídico para o processo de impeachment, e foi isso que Ciro sempre denunciou, assim como denunciou com todas as letras o desastre do governo petista.
Aqui mais um engodo com palavras bonitas. Sim, o Brasil está inserido na divisão internacional do trabalho como produtor primário, só não por imposição, mas por opção própria de suas elites, que se tornaram rentistas. Por que isso não ocorre na China ou em outros lugares? A resposta é porque governos fortes impedem esse processo, não porque suas elites não o queiram.
Mais uma distorção. A crítica não é aos juros, mas a Lula. Ele é quem tem condições de alterara essa política, e apenas ataca o BC, enquanto nada faz de efetivo para tal. Ciro, claro, falou dos juros, e apontou a ambiguidade de Lula, algo que Nildo faz questão de esquecer.
Sim, Ciro está isolado, e o próprio reconheceu isso ao dizer que não representa mais uma corrente de pensamento, mas as tradições trabalhistas não estão acabadas. O que falta ao trabalhismo é um partido que esteja preocupado em defender tais posições. O PDT atual quase chegou a fazer isso, mas se vendeu por uns carguinhos e um Ministério, que é o único que não tem liberdade de ação dentro do governo neoliberal ptucano.
A Carta de Lisboa é documento ótimo para discussões acaloradas nas universidades e em cursinhos de partidos, mas jamais chegou ao povo. O que importa aqui é o trabalho de 21 anos da ditadura em destruir o legado político trabalhista, ainda que tenha preservado algo do legado econômico). 1964 não foi contra o Comunismo, mas contra o Trabalhismo.
O PT e Lula foram criados para destruir o Trabalhismo, e foram bem sucedidos nisso, até porque tiveram todos os apoios e impulsos que precisaram para isso. O desastre Tucano tinha um plano B, e esse plano foi usado pelas burguesias nacional e estrangeira a ponto de o país que se diz esquerda apoiar um teto de gastos disfarçado de arcabouço fiscal. Algo que fizeram com a PPI da Petrobrás também. Disfarçaram, mas não mudaram nada além do nome.
Utopia não se combina com pragmatismo? Ora Nildo, se você não combina utopia com pragmatismo ou você não tem nada, ou tem o pragmatismo eleitoral do Lulopetismo, do Bolsonaro, etc. Poder pelo poder, e nada muda, porque jamais se pensou mudar nada.
No final Nildo dá uma puxada de brasa para sua revolução. De certa forma eu concordo com ele. A "democracia" burguesa brasileira jamais aceitará nenhum tipo de cisão mais forte em suas bases. Dilma não caiu por pedaladas ou nenhum crime de responsabilidade, mas por baixar juros sem oferecer nada em troca. Sim, Guedes também abaixou juros, até mais que Dilma, mas Guedes, além de entregas importantes de patrimônio público a precinho de ocasião, ainda liberou algo em torno de R$ 1 trilhão para os bancos durante a pandemia. Não se quebrará esse círculo dentro dos padrões impostos atualmente. O Brasil não é o Ceará, e regras não serão respeitadas.
O Trabalhismo precisou de uma revolução e um auto-golpe para ser implantado no país, e ditou os rumos do país por mais de 50 anos. Os liberais precisaram de 3 golpes e uma ditadura de 21 anos para enfraquecê-lo, e ainda de mais 20 anos de ações que visavam abafá-lo, além da criação de uma alternativa fake (PT). Mesmo assim ele segue vivo, porque os 3% de Ciro em 2022 não se deram pela morte da ideia, mas pela polarização imposta por todos os meios, e o abafamento da campanha cirista. Mas sim, o PDT parece ter sucumbido a isso, mas o Trabalhismo ainda não.
A solidão de Ciro Gomes e o trabalhismo
O resultado eleitoral da última disputa presidencial foi um golpe duro para as pretensões políticas de Ciro Gomes. É inegável seu retrocesso quando comparado com o desempenho no primeiro turno de 2018, razão pela qual, após a vitória de Lula, o candidato do PDT foi para um curto retiro reflexivo. A volta recente num debate realizado em Portugal despertou antigas ilusões e criou novas expectativas que se defrontam com a dura realidade brasileira e a crise do sistema político dominante.
Há um contraste evidente que passa sem registro no raso debate nacional: enquanto Ciro amarga sua solidão política e no ensaio de retorno à disputa eleitoral renova antigas críticas a Lula e ao PT, o partido ao qual está filiado (PDT) participa orgulhosamente do governo Lula na presença do ministro da previdência social Carlos Lupi, também presidente da sigla.
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